Novas e velhas calamidades

Em mais um capítulo de sua luta tenaz contra a aritmética e a racionalidade econômica, o PT espera que o novo ministro da Economia, Nelson Barbosa, cumpra o seu dever, jogue o ajuste fiscal no lixo, faça respiração boca-a-boca nos números estragados, e leve o País ao milagre da ressurreição do crescimento.

Barbosa foi incitado pelo presidente do PT, Ruy Falcão, a adotar políticas “criativas” de crescimento e foi terminantemente proibido pelo chefão do MST, João Pedro Stédile, de provocar uma só demissão a mais. O MST, avisou Stédile, do alto de sua onipotência, simplesmente “não tolerará” mais demissões.

Sabe-se que Barbosa foi ungido para o cargo no lugar do “Chicago Boy” Joaquim Levy para dar uma reviravolta de 180 graus na política econômica e tirar de cena esse papo chato de ajuste fiscal para entronizar outra vez a “nova matriz macroeconômica” que foi exatamente a rota que o governo percorreu para chegar à ruinosa situação atual.

Ao assumir, em suas primeiras declarações e entrevistas à imprensa, entretanto, Nelson Barbosa colocou o pé no freio do entusiasmo partidário. Ele disse que a prioridade do governo agora é atacar o rombo das contas públicas, porque sem isso não haverá nem crescimento sustentável, nem controle da inflação e nem aumento do emprego.

Pronto, saiu o “neoliberal” Joaquim Levy e ele foi substituído por uma cria do PT, que em vez de pegar a batuta e reger a nova sinfonia do crescimento, repetiu a mesma cantilena do seu antecessor, que saiu sem conseguir fazer nada do que pretendia e ainda acabou levando a culpa pelas irresponsabilidades dos que o antecederam.

Um cenário esquizofrênico que se repete, desde que o governo petista abandonou a política ortodoxa de Antônio Palocci, e que a atual presidente se recusou a aceitar um plano de ajuste fiscal feito por ele e que ela chamou de “rudimentar”.

E o velho axioma de Milton Friedman, segundo o qual “não existe almoço grátis”, continua soando como anátema aos ouvidos das novas e velhas esquerdas, que nunca conseguiram extrair do seu pensamento mágico um antídoto para essa mesquinha e pétrea verdade universal.

Os petistas profissionais e amadores das redes sociais e de alguns setores da imprensa se esforçam para espantar a crise da maneira mais panglossiana que conseguem: negando-a. Se as praias estão cheias no verão, se os hotéis estão lotados, se as pessoas continuam saindo de férias e se os aviões de carreira continuam voando, onde está a crise?

Os números, que insistem em manter o país em recessão durante dois anos seguidos, são evidentemente uma manipulação da imprensa, dos banqueiros, dos reacionários, dos coxinhas, dos imperialistas e dos que não gostam de viajar ao lado de pobres no avião.

O desemprego aumenta, a inflação está fugindo do controle, as contas públicas estão desarrumadas, os juros vão subir mais um pouco, mas o governo não tem nada com isso. A culpa é da falta de colaboração da oposição, que torce contra o país e não se conforma com o fato que o PT tenha tirado tantas pessoas da miséria (para a qual, aliás, as está devolvendo – mas isso não vem ao caso).

Existe uma luta sem trégua entre a narrativa forjada pelo PT e a realidade. Poderemos, segundo cálculos da revista The Economist, chegar ao final de 2016 com uma renda per capita 20% inferior à de 2010, quando ela atingiu o seu valor mais elevado.

“Agora – diz a revista – a presidente Dilma Rousseff, sucessora a quem Lula escolheu a dedo, comanda um elenco de calamidades sem precedentes”.

Quantas calamidades sobraram para 2016?

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 1º/1/2016. 

5 Comentários para “Novas e velhas calamidades”

  1. O texto do Vaia é sempre bom, merece ser lido e refletido.

    Fleumaticamente critica os petistas das redes sociais e setores da imprensa que defendem a inexistência da crise e que a oposição e enorme parte da mídia teimam em difundir e fazer crer ao povo brasileiro.

    Vaia é craque, daqueles que domina o meio de campo com classe, sabe escrever como poucos formadores profissionais de opinião que hoje vestem fardão e são companheiros de farda de Sarney e FHC.

    Os apostadores na crise, instrumento político para o impeachment esquecem de que o país vendendo minério, petróleo, soja e carne para o exterior acumula um PIB de 3 trilhões e que deve ser reduzido em 2%. Com tais números não há crise, existe apenas redução de lucros dos rentistas e um governo ineficiente que não administra parcela deste mesmo PIB, um orçamento de 1 trilhão, que deveria ser alocado de forma conveniente por levys ou barbosas.

    Crescimento, Vaia deveria saber, e se sabe deveria divulgar, não significa mais 2% ou menos 2% do enorme PIB, significa administar os recursos (impostos) e distribui-los à nação em forma de educação e saúde dignos e humanos. O resto fica por conta da mão invisível do deus mercado e da exploração do trabalho do povo brasileiro.

    O povo trabalhador vende o almoço grátis para poder jantar. Quem compra o almoço e se beneficia da crise, quer comprar o jantar.

  2. Trabalho da brasileira Grazielle David, especialista em orçamento público, que demonstra com números como os cidadãos mais ricos do Brasil sonegam anualmente mais de R$ 500 bilhões.
    Quem aderiu àquele abaixo-assinado que as mocinhas bonitinhas oferecem na frente da Fiesp, perto daquele pato inflado, contra a recriação da CPMF. Nunca se perguntou por que as entidades da indústria e do comércio, com ampla repercussão da mídia tradicional, vivem denunciando o aumento da carga tarifária e nunca se preocuparam em contabilizar os bilhões sonegados.
    Passamos a acreditar que o problema é que o governo gasta demais, principalmente com programas sociais – e vai às ruas xingar e agredir quem, no fim das contas, defende os seus interesses. É da natureza dos midiotas agir contra seus próprios interesses.

  3. Mais uma calamidade : O que era 1000, com a desvalorização da moeda, Hoje é só 500TINHO.

  4. A citação de tabelas e gráficos (Lafer etc.) é mui útil, mas é preciso lembrar de princípios:

    (não falo de corrupção, o tema é outro)

    Os Srs. Friedman e Hayek inspiraram os causadores da atual crise – Reagan e Thatcher – a fazer o que fizeram com a economia global. Basicamente, as condições que conduziram à crise de 1929 do Hoover, e em menor nível ao choque de 1973, foram patrocinadas pela escola de Chicago: a tendência a “deixar rolar” tudo, porque o mercado é racional (!!!!??).
    Resultado inevitável: superprodução com pressão por demissões, mercado acionário a fazer o que deseja, retrocessos sociais sendo tratados como “maior competitividade” – o ônus da crise transferido pelos ricos aos cidadãos de bem -, rombo nos derivativos equivalente a mil vezes o PIB mundial etc.

    (o petismo não é autor dessas coisas)

    Para zerar o rombo nos derivativos, iniciado com força através do Reagan, é preciso construir 1000 novos planetas Terra…
    O Stédile dá a entender que um povo que não cria a crise não deve pagar por ela – fato que o Sr. Vaia julga incoerente ou mesmo autoritário.
    A crise no Brasil existe, mas o formato das hipotecas norte-americanas mostrou-se muito mais danoso do que os trinta e poucos ministérios do petismo. O Sr. Vaia, provavelmente, sabe disto – e não o diz.

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