Beijou a lona

A presidente Dilma Rousseff pode não admitir. Pode fazer leitura cor-de-rosa da votação na Comissão Especial da Câmara, mas não conseguirá empanar a nua e crua realidade. O governo beijou a lona no primeiro round do impeachment.

Não tanto pelo resultado da votação, em si mesmo confortável para a oposição, mas, principalmente, pela erosão precoce do “novo centrão” articulado por Lula, a preço de ouro. Ou melhor, a preço da mais desbragada barganha de cargos públicos do pós-democratização do país.

 O governo pode se recuperar no próximo round, o da votação no plenário da Câmara? Teoricamente pode. Nunca é prudente subestimar o peso da caneta presidencial, sobretudo em um Parlamento viciado ao toma-lá-dá-cá.

Mas não é a hipótese principal. As águas não estão correndo para este moinho, ao contrário. Talvez Dilma e Lula estejam descobrindo, tardiamente, que não basta apenas instalar o mercado persa. Há de se ter credibilidade na palavra empenhada. E o histórico do governo Dilma é de uma relação autocrática, de desconfiança dos políticos, de não cumprir acordo, de nunca, absolutamente nunca, tê-los como parceiros.

Quando o governo era forte, os partidos da base engoliam a relação subalterna, mesmo sendo esnobados solenemente em diversos momentos. Com Dilma enfraquecida e surgindo outro polo, a coisa muda de figura.

Mais uma vez, confirma-se a lei da política segundo a qual a expectativa de poder atrai mais do que o próprio poder. PP, PR, PSD e peemedebistas governistas preparam as malas para pular do navio e se jogar nos braços do vice Michel Temer. Eis aí uma das grandes razões da implosão do neo-centrão, também chamado de nova “repactuação” pelo ministro Jacques Wagner.

Conspira contra a presidente seu próprio discurso. Sem governar de fato há meses, Dilma semeia desesperança e prega o medo em seus palanques.  Não acena nem com lamparina no fim do túnel, não aponta saídas para a crise que ela, seu antecessor e o PT meteram o país. Sua única preocupação é a sobrevivência do seu mandato, daí o discurso monocórdico do “não vai ter golpe”.

É muito pouco para se construir qualquer base de apoio, quanto mais sólida.

O que teria a oferecer o governo Dilma caso sobreviva ao impeachment, além da repartição do butim ministerial?

Esse discurso não encanta, sobretudo quando é cotejado com o do seu vice-presidente, cujas palavras de pacificação, união, prioridade para enfrentar os problemas econômicos soam como música nos ouvidos de parlamentares, do mundo empresarial e de boa parte da sociedade.

Independentemente do juízo de valor do vazamento do áudio de Temer, o concreto é que ele estabeleceu um contraponto ao discurso presidencial.

Dilma constrói muros, aprofunda a divisão dos brasileiros, insinua com uma “oposição selvagem”, caso o impeachment prospere.

Da presidente só se ouve anátema e mais anátema. Temer se apresenta como construtor de pontes, prega o diálogo, acena com um “governo de salvação nacional que reúna todos os partidos”.

O eixo gravitacional da política está, portanto, em mutação. A presidente é uma estrela cadente que vai perdendo seus últimos raios de luz, se é que já emitiu alguma luz. Partidos e parlamentares da base governista deixam de orbitar o Palácio do Planalto e passam a girar em torno do Palácio Jaburu, até por instinto de sobrevivência.

O deslocamento dos astros não deixa margens para dúvidas. Um governo que há 16 meses tinha uma base parlamentar mastodôntica, hoje está em palpos de aranha para assegurar o apoio necessário para inviabilizar o processo de impeachment.

E é bem possível que não consiga. O contingente de parlamentares favoráveis ao impedimento da presidente vem crescendo continuamente. Nem mesmo toda a articulação de Lula, tem sido capaz de reverter essa tendência.

Nada, porém, está dado ou decidido. Ninguém morre de véspera. Mas Dilma começará o round decisivo já nas cordas. Se não tiver muito jogo de pernas, e esse não é o seu forte, será nocauteada no dia 17. E sem qualquer chance de o Senado alterar o resultado.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 13/4/2016. 

Um comentário para “Beijou a lona”

  1. Não se pode descartar o terceiro round. Houve quedas no primeiro, cambaleia no segundo. Vai ao senado mas pode jogar a toalha ou perder por pontos?
    Seu opositor agora sem a máscara,tenta convencer a torcida da sua capacidade e da lisura da luta.
    A torcida agora oficialmente separada por uma cerca,faz seu papel e se delicia com os golpes desferidos sem saber que os vencedores estão fora do ring manipulando apostas e resultados.Preparam nova luta para o campeão na qual quem vai sangrar é a torcida.

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