A Grã-Bretanha escolhe o horror

Não se trata mais, de forma alguma, dos conceitos de “esquerda” e “direita” que vêm da época da Revolução Francesa de 1789.

Isso aí acabou – foi inteiramente sufocado pela poeira solta pela queda do Muro de Berlim e, um pouquinho maior que ele, do Império Soviético.      

A questão agora é quem vai para a frente ou quem vai trás.

Para frente são as uniões, as coligações, as alianças.

Para trás é o nacionalismo, a cegueira do isolacionismo, a eterna paixão pela possibilidade da vitória total sobre todos os outros.

Para frente é a democracia, esse tipo de coisa que é – como dizia Churchill – um horror, só que menos ruim do que todos os outros sistemas.

Para trás é o namoro com o absolutismo, a fascinação pelo poder hegemônico.

Em defesa da permanência do Reino Unido na União Européia uniram-se conservadores e trabalhistas. Ficaram contra os radicais tidos como de direita.

Os radicais são sempre radicais – sejam os que antigamente eram ditos de esquerda, sejam os que eram ditos de direita. São sempre próximos uns dos outros – tocam-se no outro lado, o lado escuro da Lua.

A saída do Reino Unido da União Européia aponta para desgraça em cima de desgraça.

A Escócia votou majoritariamente a favor da permanência, o Remain.

Boa parte da Irlanda do Norte votou a favor do Remain.

No País de Gales, foi tudo muito dividido.

Se houver no futuro próximo referendos na Escócia, na Irlanda do Norte, no País de Gales, há o sério risco de a Inglaterra ficar absolutamente solitária. Não existir mais Reino Unido.

O Império em que o Sol nunca se punha periga ficar agora reduzido a um pedacinho de uma ilhota à esquerda, no mapa, do continente europeu.

Um pedacinho de uma ilhota – decepado ao Norte, decepado ao Sudoeste.

***

Mas isso não é o pior.

O pior é que essa idiotice que a maioria dos eleitores do Reino Unido aprovou pode abrir as portas de todo tipo de secessionismo.

A Bélgica dividida em duas.

A Espanha sem a Catalunha – e, raios, já que a Catalunha se foi, por que não irem também a Galícia, o País Basco? Agora que a Rainha Isabel não está mais aí para unificar, por que não dividir?

Nesse novo maravilhoso mundo, por que razão a Itália permaneceria Itália? Epa! Vamos lá – divisão em pelo menos cinco ou seis países independentes. O Norte! A Sicília! E por aí vai…

E se a onda chega até os países satélites, subdesenvolvidos?

Vamos de Brasil do Sul e Brasil do Norte, ou de vários, diversos, muitos Brasis?

É bom não propor plebiscito sobre o assunto. O país está tão dividido, tão Fla x Flu, e tem tanta gente pró Bolsonaro, que se houver plebiscito, viramos uns cinco ou seis países diferentes.

Está tudo tão ruim, tão horroroso, que eu até admito que toparia viver num pedaço de Brasil sem petralhas.

O quê? Não, não, não: tira essa última frase! Que vergonha.

24/6/2016

3 Comentários para “A Grã-Bretanha escolhe o horror”

  1. Não se envergonhe dos seus pensamentos, divulgue-os e defenda-os, isto é a democracia a que Churchil ironizava.
    Rumo ao seu mundo Brasil sem petralhas! Sem medo de ser feliz.
    Vamos caminhar vovô? Diria minha esperança.

  2. Pelo pouco que li sobre o assunto ontem, a maioria que votou pelo Brexit é jovem, e já está arrependida. Parece que não sabiam direito o que estava em pauta. Ao que consta, as perdas não foram bem colocadas ou divulgadas. Que tristeza.

    Espero que isso não leve à separação dos outros países do Reino Unido, como você apontou.

    Em relação ao nosso terceiro mundinho, torço e votaria a favor do Brasil sair do Mercosul, mas a raposa velha já disse que é contra. Sendo assim, espero que nos tirem à força, já que foi essa a promessa dos países amiguinhos do poste. (Também voto sim para a volta da antiga capa do nosso passaporte ASAP).

  3. É importante, Vaz, não entrar naquele conto-de-fadas de que os blocos geopolíticos são formados de países que querem colaborar uns com os outros.

    Os países NÃO QUEREM colaborar uns com os outros, mas sim parasitar-se mutuamente.
    [sinto-me obrigado a concordar com o canalha do Hobbes]

    Bulgária e Romênia querem capitais alemães; a Alemanha quer a mão-de-obra baratíssima deles, etc.

    Se as nações são parasitas, por que blocos econômicos? Um bloco só serve – em seus objetivos primordiais – para enfrentar um outro bloco! Tal noção me parece bem realista, com ou sem Guerra Fria.

    As relações internacionais são um gigantesco lamaçal; deles saem blocos, bem como os plenamente justificáveis separatismos catalães e outros.

    De nada adianta chamar o gesto britânico de idiotice. As nações NÃO MERECEM viver em blocos. Não fizeram e não fazem jus.

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