Saem os bilhões, voltam os centavos

Começou de novo. E, um ano e meio depois das manifestações que sacudiram o país em junho de 2013, governo algum tem noção do que fazer com isso. Muito menos como coibir o vandalismo, o desrespeito com a coletividade, o quebra-quebra. Tudo do mesmo jeitinho: uns poucos provocam, incendeiam lixo, estraçalham vitrines, forçam a reação da polícia, que, como patinho, cai na provocação, arreganha o cassetete, lança gás e atira balas de borracha na turba. Prende e depois solta.

De um lado, não dá mais para o Movimento Passe Livre (MPL), que organiza os eventos contra as tarifas de transporte urbano, se eximir de responsabilidades quanto às depredações. De outro, já teria dado tempo de os governos se prepararem. No mínimo, adquirir caminhões com jatos d’água, algo usado em todas as partes do mundo.

Os motivos dos organizadores são os mesmos: impedir os reajustes de passagens já concedidos em pelo menos 10 capitais e em outras grandes concentrações urbanas, como Campinas (SP).

Na cidade de São Paulo, a exigência é mais aguda: não se trata de anular o aumento das tarifas -congeladas desde 2011. Querem ampliar ganhos, até por que saíram absolutamente vitoriosos nas jornadas de junho, derrotando de uma só vez o prefeito Fernando Haddad (PT) e o governador Geraldo Alckmin (PSDB), agora reeleito.

Parece absurdo, mas para vários lados o melhor é ser assim mesmo.

A quebradeira garante ao MPL cobertura televisiva e primeiras páginas na internet e nos jornais. Dá repercussão ao movimento. Ao mesmo tempo, beneficia o PT, afastando das ruas aqueles que querem ocupá-las sem baderna e por motivos que vão muito além do reajuste das tarifas. A lista vai de Fora PT ao impeachment de Dilma, do não à corrupção à imbecilidade – felizmente isoladíssima – da volta dos militares ao poder.

Ainda que possam incomodar os petistas Haddad e o recém empossado governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel, o reinício da pendenga do passe livre pode ser benéfico a Dilma. Redireciona o foco.

Em vez dos bilhões afanados da Petrobrás, o país começará discutir os R$ 0,50 a mais cobrados nos ônibus e trens de São Paulo ou os R$ 0,40 adicionados ao transporte público do Rio.

Black blocs e as bombas da PM substituirão as manchetes dos escândalos diários de corrupção patrocinados pelo governo. Marqueteiro algum poderia pensar coisa melhor.

Mas, como é difícil saber para que lado o busca-pé corre depois de aceso, a turma de Dilma terá de pensar em algo melhor do que receber patrocinadores de vândalos no Planalto ou na balela de um pacto nacional, que começaria pela reforma política por meio de um plebiscito inconstitucional.

Não colou em 2013 e não há a menor chance que emplaque agora. Dilma e o MPL terão de entender que o país já não é o mesmo. Algo dificílimo para ambos.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 11/1/2014. 

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