Oposição com pimenta

Embalada nos 51 milhões de votos do candidato Aécio Neves, a oposição acordou. Exibindo articulação inédita, foi capaz de criar constrangimentos, denunciar manobras e até mesmo impor derrotas, ainda que parciais, à acachapante maioria governista. Incansável, protagonizou uma das mais longas sessões contínuas do Congresso Nacional, expondo chagas que Dilma, mesmo vitoriosa nas urnas, aprofunda em vez de cicatrizar.

Desacostumados com oposição fazendo oposição, governistas e a própria presidente foram pegos de surpresa. Ficaram atônitos.

Esforçaram-se semanas sem conseguir reunir a tropa para apreciar o projeto que enterra a meta fiscal e livra Dilma de ter de responder por crime de responsabilidade. Foram enredados por mais de 18 horas antes de ver a matéria aprovada, ainda inconclusa, pendente de apreciação de emenda. Não conseguiram nem mesmo o voto do folclórico palhaço Tiririca (SP), do aliado PR.

Uma vitória estranha, nada compatível com um governo que acaba de ter seu mandato renovado por mais quatro anos. Vitória envergonhada, em que o PT apoiou a expulsão de manifestantes das galerias, executada com truculência. Vitória amarga, construída a partir da chantagem, com a institucionalização do “toma lá dá cá” estabelecido por decreto e publicado no Diário Oficial.

Vitória que sepulta qualquer ilusão, até dos mais otimistas, de que a relação governo-Congresso possa vir a ter alguma dignidade.

Por seu lado, oposicionistas têm feito aquilo e tão somente aquilo para o que foram credenciados por quem lhe confiou votos: oposição. Algo que pareciam não ter vocação para fazer. Não deveriam “causar”, como se diz na gíria.

Sem fôlego diante das descobertas diárias de roubalheira na Petrobras, o governo sabe que não terá trégua.

Diante da denúncia de que o dinheiro afanado era convertido em doações legais para o PT, mais uma vez a culpa foi atribuída à oposição. A presidente optou pela tática da inversão que tanto sucesso faz no petismo desde os tempos de Lula: punir o adversário e acusar de antidemocrático qualquer um que divirja dela, a vitoriosa, e de seu governo.

Disparou besteiras como o desrespeito ao resultado das urnas e às escolhas da população. Atiçou a oposição como se reinasse em tempos de passividade. E não parou de fornecer munição.

Sua performance como presidente reeleita é um desastre. Não consegue – como nunca conseguiu – entender a dinâmica do Congresso. Tropeça na montagem da equipe, apanha do aliado PMDB. Tem ministros que são sem ser e outros que serão e não estão sendo. Faz transição em seu próprio governo como se oposição fosse.

Isso é só parte do cardápio de desacertos.

Dilma pode ter a faca, o garfo e a caneta, mas pelo sabor destas últimas semanas, o tempero, especialmente a pimenta, está nas mãos da oposição.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 7/12/2014. 

Um comentário para “Oposição com pimenta”

  1. Enfim parece que temos oposição. Meio maluquinha, com passeatas pela Av.Paulista, recheada de infriltados pedindo a volta dos militares. No congresso ocupam galerias, gritam palavras de ordem e chamam os “representantes” eleitos de vagabundas. O lider da oposição sonha se tornar um novo Lula, afinal se um operário chegou até a presidência, porque ele neto da oligarquia, com meritório curriculun, não pode almejar a presidência, tal como o vovô, por vias indiretas e golpistas em um terceiro turno.
    A oposição se descobre oposição, procura copiar as ações da oposição quando estava nas mãos petistas.

    Quem será o guia dos oposicionistas? Aécio? A tucanada paulista FHC, Serra e Alkimin ainda se lembram do apoio modesto do mineiro em 2010.
    Pena pra cá, pena prá lá, a tucunada não se entende, mensalão, trensalão, empreiteiras e cartéis se misturam nas siglas partidárias.

    A oposição só se entende através da mídia golpista que continua demitindo e assalariando jornalistas. Admirável a unidade de Abril/Estadão/Folha coadjuvada pela unipresente TV GLOBO.

    A votação da mudança de critérios contábeis da LDO mostra o caminho para a OPOSIÇÃO, não dá para confiar na república representativa. O congresso está recheado de 300 picaretas, parafraseando o antigo opositor.

    A oposição tem que exigir UMA REFORMA POLÍTICA JÁ.DOA EM QUEM DOER!
    Uma oposição inteligente, mais propositiva, menos raivosa,menos frustada, e liderada por políticos com história semelhante a de Dilma certamente contará com a adesão de 51 milhões que votaram contra o PT, 36 milhões se abstiveram, e uma grande parte dos 54 milhões que deram segundo mandato a presidenta.

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