Más notícias do país de Dilma (142)

Falta confiança no país. Quem diz isso não é a oposição, não são alarmistas, pessimistas, antipatrióticos – são os números. Nos últimos sete dias, foram divulgadas três pesquisas realizadas por diferentes instituições que mostram a queda nos índice de confiança.

O Índice de Confiança do Empresário Industrial (Icei) caiu de 49,2 pontos, em abril, para 48 pontos, em maio – nos dois casos abaixo da média de 50 pontos. Ou seja, o grau de pessimismo superou o do otimismo pelo segundo mês consecutivo. A pesquisa é da Confederação Nacional da Indústria (CNI).

O Índice de Confiança do Consumidor (ICC) medido pela Fundação Getúlio Vargas caiu para 3,3% em maio em relação a abril, e atingiu 102,8 pontos, o menor nível desde abril de 2009, quando estava em 99,7 pontos. Além disso, a queda foi a mais intensa desde agosto de 2011 (-5% em relação ao mês anterior).

Outro Índice de Confiança do Consumidor, este medido pela Federação do Comércio do Estado de São Paulo, caiu 25% em relação a maio de 2013 e 9% na comparação com abril deste ano. Foi a maior retração anual da série histórica do indicador, que começou a ser apurado em julho de 1994. O índice, que hoje está em 109,5 pontos, encontra-se no menor nível desde outubro de 2005. “‘A escalada do pessimismo é nítida e generalizada’, afirma o assessor econômico da Fecomércio-SP, Altamiro Carvalho. Ele observa que desde fevereiro do ano passado o ICC vem apresentando recuos em relação ao mesmo mês do ano anterior e que a dimensão da queda aumenta a cada mês.

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Não é à toa que falta confiança. A cada semana, surgem novas más notícias. Aos montes, aos magotes. Nos últimos sete dias, foram divulgados os seguintes números ruins:

* Um dos principais indicadores da saúde financeira de um país, as contas externas brasileiras tiveram déficit de US$ 33,476 bilhões de janeiro a abril deste ano, segundo dados do Banco Central. É o pior resultado da história. O montante corresponde a 4,65% do Produto Interno Bruto.

* O cenário incerto da economia, marcado por baixo crescimento do mercado doméstico e das exportações, provocou uma piora nas intenções de investimento da indústria. Pesquisa da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) mostra que um terço (33,5%) das empresas não pretende investir em 2014, o maior resultado em três anos. No ano passado, 19,9% estavam nessa condição. Entre as que vão investir, o desembolso será 4,7% menor neste ano e deve somar R$ 175,1 bilhões, o terceiro ano seguido de queda. Em 2013, os investimentos industriais somaram R$ 183,7 bilhões. A pesquisa consultou cerca de 1.200 empresas, de todos os portes, entre fevereiro e abril, e retrata a expectativa dos empresários da indústria nacional.

* Apesar da queda de alguns tributos e das desonerações, o governo federal registrou em abril mais um recorde na arrecadação. Nós pagamos para o governo R$ 105,884 bilhões em impostos e contribuições, uma alta de 0,93% na comparação com o mesmo mês de 2013, já descontando a inflação. Em abril de 2013, foram arrecadados R$ 104,9 bilhões. No acumulado de janeiro a abril, o total recolhido foi de R$ 399,310 bilhões, também recorde para o período.

* Ao longo do governo Dilma, o Brasil perdeu 16 posições em ranking de competitividade e se tornou uma das dez economias menos eficientes. No último ranking de competitividade, referente a 2014, montado pelo International Institute for Management Development (IMD), com apoio no Brasil da Fundação Dom Cabral, o país perdeu mais três posições e está em 54ª lugar numa relação de 60 economias. Ou seja, o Brasil é um dos dez piores em poder de competição no mundo.

* O Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu que 28% do valor total de ativos e passivos do balanço da União tem distorções graves, o que compromete a credibilidade das demonstrações contábeis do governo.

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Esses itens acima são apenas alguns destaques das más notícias dos últimos sete dias. É necessário realçar também que, como quem não quer nada, a presidente Dilma Rousseff assinou um decreto que, a rigor, instaura no país um novo sistema de governo, a Constituição e o Legislativo que se danem. Essa novidade – surgida quando o país está prestando atenção aos últimos preparativos para a Copa do Mundo, e temendo o que possa acontecer quando os olhares do planeta inteiro estarão voltados para cá – abre esta compilação, a 142ª compilação semanal de notícias e análises que comprovam os malefícios e a incompetência do lulo-petismo como um todo e do governo Dilma Rousseff em especial. Foram publicadas entre os dias 23 e 29 de maio.

O PT quer mudar o sistema de governo com um decreto 

* Cria-se a Política Nacional de Participação Social; o Poder Legislativo não é mais necessário, e a Constituição, que se dane

“A presidente Dilma Rousseff quer modificar o sistema brasileiro de governo. Desistiu da Assembléia Constituinte para a reforma política – idéia nascida de supetão ante as manifestações de junho passado e que felizmente nem chegou a sair do casulo – e agora tenta por decreto mudar a ordem constitucional. O Decreto 8.243, de 23 de maio de 2014, que cria a Política Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Participação Social (SNPS), é um conjunto de barbaridades jurídicas, ainda que possa soar, numa leitura desatenta, como uma resposta aos difusos anseios das ruas. Na realidade é o mais puro oportunismo, aproveitando os ventos do momento para impor velhas pretensões do PT, sempre rejeitadas pela Nação, a respeito do que membros desse partido entendem que deva ser uma democracia.

“A fórmula não é muito original. O decreto cria um sistema para que a ‘sociedade civil’ participe diretamente em ‘todos os órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta’, e também nas agências reguladoras, através de conselhos, comissões, conferências, ouvidorias, mesas de diálogo, etc. Tudo isso tem, segundo o decreto, o objetivo de ‘consolidar a participação social como método de governo’. Ora, a participação social numa democracia representativa se dá através dos seus representantes no Congresso, legitimamente eleitos. O que se vê é que a companheira Dilma não concorda com o sistema representativo brasileiro, definido pela Assembléia Constituinte de 1988, e quer, por decreto, instituir outra fonte de poder: a ‘participação direta’.

“Não se trata de um ato ingênuo, como se a Presidência da República tivesse descoberto uma nova forma de fazer democracia, mais aberta e menos ‘burocrática’. O Decreto 8.243, apesar das suas palavras de efeito, tem – isso sim – um efeito profundamente antidemocrático. Ele fere o princípio básico da igualdade democrática (‘uma pessoa, um voto’) ao propiciar que alguns determinados cidadãos, aqueles que são politicamente alinhados a uma idéia, sejam mais ouvidos.

“A participação em movimentos sociais, em si legítima, não pode significar um aumento do poder político institucional, que é o que em outras palavras estabelece o tal decreto. Institucionaliza-se assim a desigualdade, especialmente quando o Partido (leia-se, o Governo) subvenciona e controla esses ‘movimentos sociais’.

“O grande desafio da democracia – e, ao mesmo tempo, o grande mérito da democracia representativa – é dar voz a todos os cidadãos, com independência da sua atuação e do seu grau de conscientização. Não há cidadãos de primeira e de segunda categoria, discriminação que por decreto a presidente Dilma Rousseff pretende instituir, ao criar canais específicos para que uns sejam mais ouvidos do que outros. Ou ela acha que a maioria dos brasileiros, que trabalha a semana inteira, terá tempo para participar de todas essas audiências, comissões, conselhos e mesas de diálogo?

“Ao longo do decreto fica explícito o sofisma que o sustenta: a idéia de que os ‘movimentos sociais’ são a mais pura manifestação da democracia. A História mostra o contrário. Onde não há a institucionalização do poder, há a institucionalização da lei do mais forte. Por isso, o Estado Democrático de Direito significou um enorme passo civilizatório, ao institucionalizar no voto individual e secreto a origem do poder estatal. Quando se criam canais paralelos de poder, não legitimados pelas urnas, inverte-se a lógica do sistema. No mínimo, a companheira Dilma e os seus amigos precisariam para esse novo arranjo de uma nova Constituição, que já não seria democrática. No entanto, tiveram o descaramento de fazê-lo por decreto.

“Querem reprisar o engodo totalitário, vendendo um mundo romântico, mas entregando o mais frio e cinzento dos mundos, onde uns poucos pretendem dominar muitos. Em resumo: é mais um ato inconstitucional da presidente Dilma. Que o Congresso esteja atento – não apenas o STF, para declarar a inconstitucionalidade do decreto -, já que a mensagem subliminar em toda essa história é a de que o Poder Legislativo é dispensável.” (Editorial, Estadão, 29/8/2014.)

Esses babacas que querem um país melhor

* Lula começou sua carreira falando em aspirações dos mais pobres; hoje prega que não precisamos de metrô, basta ir de jegue

“Houve um tempo em que esperávamos a Lua entrar na sétima casa, Júpiter se alinhar com Marte e a paz reinar no planeta. Era a aurora da era de Aquarius. Aquarius, Aquarius. As mulheres arrancando os sutiãs, os homens com calça boca de sino, cavalos da polícia dançando, tudo porque a Lua tinha, finalmente, entrado na sétima casa.

“Nossas esperanças hoje são mais prosaicas. Em vez de Júpiter se alinhar com Marte, contemplamos o alinhamento da Copa do Mundo com as eleições no Brasil. E os nervos estão mais sensíveis. Na cúpula, governo e Fifa se estranham. Para Jérôme Valcke, o contato com as autoridades brasileiras foi um inferno. Para Dilma Rousseff, Valcke e Joseph Blatter são um peso.

“É o tipo de divórcio que não se resolve com as cartomantes que trazem de volta a pessoa amada em três dias. Eles se distanciam num mero movimento defensivo. Quem será o culpado se as coisas não derem certo?

“Dilma, com a Copa das Copas, quer enfrentar a eleição das eleições e põe toda a sua esperança nos pés dos atletas. A Fifa não gostaria de entrar numa gelada no Brasil, mesmo porque o Qatar a espera com calor de 52 graus. Seriam dois fracassos seguidos, pois Blatter já admitiu que o Qatar foi um erro.

“Essa conjunção histórica está levando a uma certa irritação da cúpula conosco, que não inventamos essa história. Blatter declarou que os brasileiros precisavam trabalhar mais porque as promessas de Lula não foram cumpridas. Nada mais equivocado do que essa visão colonial. Se Blatter caísse no Brasil e vivesse nossa vida cotidiana, constataria que trabalhamos muito mais que ele mesmo, um cartola internacional. Desde quando o objetivo do nosso trabalho é cumprir as promessas de Lula?

“A tática de Lula é diferente da de Blatter. Lula não critica nossa insuficiência no trabalho, mas nossas aspirações de Primeiro Mundo. Ele, que vive espantando o complexo de vira-latas, apossando-se politicamente de uma frase de Nelson Rodrigues, nos convida agora a reviver o espírito que tanto condena: ‘Querer vir de metrô ao estádio é uma babaquice. Viremos a pé, de jumento…’. Para Blatter, precisamos trabalhar mais; para Lula, desejar menos. Só assim nos transfiguramos na plateia perfeita para o espetáculo milionário.

“Lula começou sua carreira falando em aspirações dos mais pobres, hoje prega o conformismo. Não é por acaso que o PT faz anúncios inspirados no medo de o adversário vencer as eleições. Não há mais esperança, apenas um apego desesperado aos carguinhos, à estrutura do Estado, aos grandes negócios.

“No passado exibi um filme em que Lula e Sérgio Cabral dialogam com um garoto do Complexo da Maré. Eles entram em discussão, Cabral ofende o jovem e Lula diz ao garoto que gostava de jogar tênis: ‘Tênis é um esporte de burguês’. Na cabeça de Lula, o menino tinha de se dedicar ao futebol. Outras modalidades seriam reservadas aos ricos. Se pudesse livrar-se de seus aspones e andar um pouco até a Baixada Fluminense, veria um campo de golfe em Japeri onde atuam dezenas de garotos pobres da região. Dali saem alguns dos melhores jogadores de golfe do Brasil.

“Lá por cima, pela cúpula, muito nervosismo, uma certa impaciência com um povo que não se ajusta ao espetáculo. Estão mais ansiosos que os próprios jogadores para que o juiz dê o apito inicial. Nesse momento, acreditam, o Brasil cai num clima de festa. Com a vitória da seleção o Brasil entraria num alto-astral e os carguinhos, os grandes negócios, tudo ficaria como antes.

“Li nos jornais algumas alusões à Copa de 70, a que assisti na Argélia. De fato, o PT vai se agarrar à seleção como o governo Médici o fez naquela época.

“Mas já se passaram tantos anos, o Brasil mudou tanto, e o alinhamento das eleições com a Copa, organizada pelo País, tudo isso traz novidades que a experiência de 1970 não abarca.

“Estamos entrando num momento inédito. Dilma é vaiada em quase todo lugar por onde passa. Lula está visivelmente ressentido com o povo, que não o celebra pela realização da Copa; que é babaca a ponto de desejar ir de metrô ao estádio.

“Não importa qual deles venha. ‘Que vengan los toros’, como dizem os espanhóis. Não importa quantos gols nosso ataque faça – e espero que sejam muitos -, a glória do futebol não obscurece mais nossas misérias políticas e sociais. Se os idealizadores da Copa no Brasil fizessem uma rápida pesquisa, veriam que o sonho de projetar a imagem de um país pujante e pacífico está ardendo nas fogueiras das ruas, na violência das torcidas, no caos cotidiano nas metrópoles, nos relatos sobre a sujeira da Baía de Guanabara.

“O governo do PT e aliados não poderá esconder-se atrás do futebol, porque eles já foram descobertos antes de a Copa começar. A Copa do Mundo não sufoca as denúncias de corrupção porque a própria Copa está imersa nela. A Fifa, com Jérôme Valcke sendo acusado de venda irregular de jogadores, não ajuda. Até o técnico Felipão caiu nas redes do fisco português.

“O sonho de uma platéia ideal para a Copa, milhares de pessoas com bandeirinhas, de um eleitorado ideal que vota sempre nos mesmos picaretas, de torcedores ideais que vão a pé ou de jumento para estádios bilionários, esse sonho entra em jogo também. Assim como aquele de projetar a imagem positiva do Brasil, o sonho de uma plateia ideal para a Copa foi por terra. Nem todos cantam abraçados diante das câmeras.

“Começou um jogo delicado em que a Copa do Mundo é apenas uma etapa. Valcke vai viver o inferno nos 52 graus do Qatar e Dilma enfrentará a eleição das eleições, a qual precisa vencer, mas não para de cair.

“A Lua entrou na sétima casa e não veio o paraíso. As eleições se alinham com a Copa, como Júpiter e Marte, e o Brasil, num desses momentos de verdade decisivos para sair dessa maré. Se estão nervosos agora, imagino quando as coisas esquentarem.

“Os babacas que querem ir ao estádio do metrô podem querer também um governo limpo, um combate real à corrupção, serviços públicos que funcionem.

“Babacas, felizmente, são imprevisíveis.” (Fernando Gabeira, Estadão, 23/5/2014.)

* Querer inflação na meta, realismo na gestão dos preços administrados, credibilidade nas contas públicas? Que babaquice é essa?

“Dentro de duas semanas, o país estará a exatos quatro meses das eleições. No Planalto, a fantasia de que o término do mandato seria marcado por um grand finale foi abandonada há muito tempo. O governo já não alimenta ilusões. Está perfeitamente consciente de que tem uma travessia muito difícil pela frente. Dar-se-á por satisfeito se, nessa reta final, puder continuar avançando aos trancos e barrancos até a linha de chegada, sem que as coisas fujam ao controle em áreas mais problemáticas. Além de torcer para que a Copa não enseje um turbilhão de inquietação social, a presidente reza a cada dia para que os céus não a obriguem a impor um racionamento de energia elétrica em meio à campanha eleitoral.

“Tendo em vista as evidências cada vez mais contundentes de deficiência na atuação do governo em várias áreas, o Planalto parece ter dado sinal verde para que seus porta-vozes passem da fase de negação à de racionalização. Mas explicar o inexplicável não tem sido fácil, como bem ilustram esforços recentes de dois porta-vozes de alto coturno.

“Em longa e belicosa entrevista concedida à Folha de S.Paulo em 14 de maio (disponível, na íntegra, em folha.com/no1453855), o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, fez o que pôde para racionalizar aspectos especialmente indefensáveis da política econômica do governo. Sem sucesso. Os pontos altos foram a denúncia da existência no país de uma ‘campanha pró-inflação’’, promovida por ‘quem tem interesse em aumentar a taxa de juros’’, e a racionalização do represamento de preços e tarifas controlados pelo governo. Uma pérola. ‘Deixa eu dizer uma coisa, preços administrados são preços administrados. Porque o conceito é este, você administra em função do interesse estratégico da economia, dos consumidores…’ E, mais adiante: ‘preços administrados são administrados em função do esforço de fazer uma política anticíclica’’. Afirmação que só faria algum sentido se fosse alusão, em ato falho, ao ciclo eleitoral, que é o que, de fato, explica o represamento.

“Entendidas como reconhecimento inequívoco de que o governo está represando preços e tarifas, as ineptas explicações do ministro-chefe da Casa Civil foram prontamente repelidas pelo ministro da Fazenda. Guido Mantega continua acreditando que, nessa questão, ainda há muito espaço para insistir na negação. Não vê razão para já passar à fase de racionalização.

“O que, sim, já não pode ser negado é o gritante despreparo com o que o país terá de enfrentar o desafio de sediar a Copa do Mundo dentro de três semanas. Alarmado com a precariedade da infra-estrutura, o secretário-geral da Fifa, Jérome Valcke, achou prudente alertar torcedores estrangeiros que pretendem vir ao Brasil. ‘Não apareça pensando que é fácil se locomover.’’ Foi o que bastou para que o ex-presidente Lula se mobilizasse. E oferecesse uma racionalização completamente estapafúrdia para o fato de que a tão prometida infra-estrutura de transporte de massa que estaria acoplada aos estádios não será entregue. ‘Brasileiro nunca teve problema’’ para chegar aos estádios, arguiu Lula. ‘Vai a pé, descalço, de bicicleta, de jumento, de qualquer coisa. Mas o que a gente está preocupado é que tem que ter metrô, tem que ir até dentro do estádio? Que babaquice é essa?’ (Folha de S.Paulo, 17 de maio).

“É bem provável que Lula considere tal ‘argumento’ um achado. Afinal, pode ser reaplicado a toda e qualquer deficiência que venha a ser cobrada do governo. No âmbito da Copa, serviria também para justificar por que os aeroportos não estarão prontos, os estádios não terão rede adequada de internet móvel e os jornalistas estrangeiros não contarão com condições apropriadas de trabalho.

“Muito pior ainda será se o mesmo ‘argumento’ vier a ser aplicado a outras mazelas bem mais sérias que as da Copa. Querer inflação na meta, realismo na gestão dos preços administrados, credibilidade nas contas públicas, oferta confiável de energia elétrica e uma economia que cresça a taxas menos pífias? ‘Que babaquice é essa?’” (Rogério Furquim Werneck, O Globo, 23/5/2014.)

A Copa de Lula e Dilma

* Uma super exibição das mazelas do Brasil

“Quando disputou e arrancou o privilégio de sediar a Copa do Mundo, o governo Lula pretendeu aproveitar o evento para uma super exibição do Brasil para o mundo, em capacidade administrativa e potência econômica.

“Enormes focos de luz estão dirigidos agora para cá e para tudo o que há de errado. A curiosidade do exterior não se limita à degustação de coisas daqui, como caipirinha, suco de maracujá e pão de queijo. Extravasa para a nossa incompetência. O Brasil está frustrando as expectativas criadas quando se tornou o B do Brics. Algumas matérias, as do jornal inglês Financial Times, de 4/5, e da revista alemã Der Spiegel, de 11/5, foram demolidoras.

“Além de advertir os visitantes para os riscos que correm por aqui com segurança pessoal e alimentação nem sempre confiável, os grandes jornais e revistas, a TV e a internet não param de desnudar as mazelas e a desorganização do País. Os preparativos para a Copa foram sucessão de encrencas: falhas de planejamento, estouro injustificável de custos, desperdícios, atrasos enormes e baixa qualidade de algumas obras. ‘Isso me envergonha’ — disse sexta-feira o campeão Ronaldo Fenômeno.

“Ontem (24/5), o correspondente do Estadão em Genebra, Jamil Chade, relatou que a Copa baterá todos os recordes de lucro da história do futebol (…). Será sucesso de bilheteria, de arrecadação de direitos para a Fifa e de lucros para as patrocinadoras. Mas, na percepção do brasileiro comum, pouco sobrará para ele além de eventuais alegrias com as vitórias de sua seleção.

“As manifestações que pipocam em todas as grandes cidades, inclusive entre movimentos protegidos pelo governo, como o MST, levantam dúvidas sobre o acerto da decisão que deu prioridade às obras dos estádios, em detrimento dos investimentos em ensino, em saúde e em transporte público. Esperava-se que este fosse um dos bons resultados indiretos. Mas nessa área as coisas estão piorando. O próprio Lula considera ‘babaquice’ a construção de linhas de metrô que atendam a estádios de futebol, sem levar em conta as necessidades das populações vizinhas. Ele deve discordar da presidente Dilma que, na sexta-feira, afirmou que a construção e a ampliação dos aeroportos não vieram para benefício dos torcedores estrangeiros, mas para atender a 112 milhões de passageiros no Brasil. Não faz sentido argumentar que as imposições da Fifa são descabidas. Estão, são condições já previstas por quem se apresentou como candidato à sede da Copa.

“É provável que, a partir do momento em que a seleção canarinho entrar em campo, as manifestações de indignação refluam e sejam deixadas para depois. Mas não dá para esconder que as novas classes médias se sentem fortemente frustradas com a baixa qualidade dos serviços públicos e com o derretimento da capacidade de consumo provocado pela inflação de mais de 6% ao ano. Isso exige conserto da economia que não aparece em nenhuma das prioridades do governo Dilma.” (Celso Ming, Estadão, 25/5/2014.)

* Copa vai custar R$ 1,1 bilhão em subsídios, diz o Tribunal de Contas

“A Copa do Mundo deve custar R$ 1,1 bilhão em benefícios tributários e subsídios ao crédito até 2014, segundo o Tribunal de Contas da União (TCU). Conforme dados do relatório do órgão sobre as contas do governo, foram R$ 500 milhões para os estádios, R$ 138 milhões para a mobilidade urbana, R$ 37 milhões para o programa Procopa Turismo e R$ 466 milhões para subsidiar a organização do torneio.

“As desonerações foram concedidas por exigência da Fifa, que cobrou o compromisso dos governos federal, estaduais e municipais para facilitar a construção de estádios, obras de mobilidade urbana, aeroportos, telecomunicações, infra-estrutura de turismo e segurança pública.

“De acordo com o TCU, a metodologia para o cálculo de benefícios e subsídios na área de crédito considera o valor do financiamento de um ativo do setor público e a diferença entre a taxa de juros do empréstimo e o custo de oportunidade – quanto esse dinheiro renderia no mercado se estivesse aplicado em outra iniciativa – para o uso do recurso. Há subsídio, portanto, quando o custo de oportunidade do governo federal é maior que a taxa de juros do empréstimo.

“Ao todo, bancos públicos (BNDES, Caixa, Banco do Brasil, Banco do Nordeste do Brasil e Banco da Amazônia) desembolsaram R$ 5,6 bilhões entre 2010 e 2013 para projetos ligados à Copa. A maioria dos recursos – R$ 4,9 bilhões – saiu do BNDES. Os subsídios na área de crédito atingiram R$ 552,3 milhões entre 2010 e 2013.

“O governo não informou, no entanto, os benefícios creditícios estimados para os próximos anos. Por essa razão, o relatório do TCU impôs uma ressalva ao relatório e cobrou do Ministério da Fazenda uma projeção dos subsídios esperados até 2015.

“Os subsídios tributários, por sua vez, devem alcançar R$ 522,9 milhões até 2015. A conta inclui também a isenção de impostos às importações, pessoas jurídicas, pessoas físicas e em tributos indiretos nas compras feitas pela Fifa.

“As desonerações referentes ao Recopa somaram R$ 121,6 milhões até 2014. O regime especial prevê a suspensão de tributos e contribuições para venda no mercado interno, importação de máquinas e equipamentos e materiais de construção em estádios da Copa. A validade do Recopa se encerra em 30 de junho deste ano.

“O TCU ressaltou que as operações cujas fontes de recursos são o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) não geram subsídios creditícios, pois os recursos pertencem ao trabalhador e são, portanto, privados.

“De acordo com a Caixa, os financiamentos de projetos de mobilidade urbana relacionados à Copa com recursos do FGTS somaram R$ 6,4 bilhões, dos quais R$ 1,7 bilhão foram desembolsados até o fim do ano passado.” (Anne Warth, Estadão, 29/5/2014.)

* Aeroporto “padrão Brasil”, definitivamente, não é aeroporto de bom padrão

“Ao tentar rebater as críticas aos aeroportos brasileiros afirmando que eles não são ‘padrão Fifa’, mas, sim, ‘padrão Brasil’, a presidente Dilma mais uma vez escorregou no improviso (dando de barato que não foi uma ‘sacada genial’ de seus marqueteiros) e, sem querer, chancelou o ‘padrão Brasil’ como definição de produto de má qualidade.

“Até hoje produtos ‘made in China’ carregam consigo a desconfiança do consumidor, enquanto os ‘made in Japan’ já conseguiram ser um atestado de qualidade. Os aeroportos ‘made in Brasil’ definitivamente não são sinônimo de coisa boa, pelo menos enquanto não entram em funcionamento os novos terminais que deveriam estar prontos para a Copa.

“O Brasil, como nação, perdeu uma grande oportunidade de se mostrar ao mundo como capacitado a realizar grandes eventos como uma Copa ou as Olimpíadas. Só havia uma razão para o governo brasileiro batalhar por essa realização, e por isso a China realizou as Olimpíadas de 2008, a África do Sul realizou a Copa em 2010 e a Rússia vai ser a sede da Copa de 2018.

“Todos esses países que formam os Brics têm como objetivo ganhar espaço político no mundo multipolar, e o Brasil estava no caminho certo ao pleitear a Copa e as Olimpíadas quase ao mesmo tempo. Mas perdeu sua grande chance ao não se dedicar à organização e ao planejamento desses eventos planetários com a prioridade devida. Valeu mais para o governo Lula ganhar a disputa pela realização deles do que a realização em si.

“Resta agora torcer para que, mesmo dentro de condições mínimas, corra tudo bem neste próximo mês. Mas o que o mundo está vendo nestes momentos pré-Copa não faz bem à imagem do país. Até índios dando flechadas em plena Esplanada dos Ministérios em Brasília apareceram nas televisões internacionais, reforçando estereótipos. A questão é que grupos oportunistas, que querem aproveitar a Copa para fazer chantagem, fazem greves, pedem aumentos abusivos, interrompem o trânsito.

“Mesmo um grupo pequeno consegue hoje interromper o trânsito nas grandes metrópoles, parando as cidades. E há ainda grupos minoritários de vândalos, ou de black blocs, que fazem uma campanha contra a Copa que absolutamente não envolve a maioria do povo.

“O sentimento geral é de crítica ao governo, que não cumpriu o que prometeu, atrasou tudo, mostrou ineficiência. As pessoas suspeitam de que houve muita corrupção nas obras da Copa, mas todas essas são críticas específicas, ninguém é maluco, a esta altura, de achar que o melhor é que não tenha Copa.

“Pode-se até achar que não deveria ter Copa, que o governo deveria, em vez de ter batalhado para sediá-la, não ter colocado isso na sua pauta, não deveria ser objetivo prioritário para um país pobre, necessitado de muitas coisas. Mas, já que fez, não há sentido em querer boicotar a Copa, é coisa de minorias.

“Misturar política com Copa do Mundo, e aproveitar a situação para tirar proveito próprio ou político, é atitude criticável. Mas o governo também precisaria atuar com mais decisão desde sempre, no relacionamento com os chamados ‘movimentos sociais’, para evitar os abusos que estão acontecendo hoje.

“Agora, diante da realidade que o populismo não conseguiu controlar, é preciso montar esquemas de segurança menos falhos, cumprir pelo menos a sua parte agora, já que a parte dos chamados legados da Copa está prejudicada pelos atrasos nas obras.

“Pelo menos agora o governo tem que montar um esquema para garantir a segurança das pessoas e das delegações, dos mandatários que vêm ver os jogos. Mais uma demonstração de ineficiência do esquema oficial foi vista na saída da delegação brasileira para Teresópolis, quando professores em greve chegaram a atacar o ônibus com os jogadores da seleção brasileira dentro.

“Não importa se a culpa é do governo federal ou dos governos estaduais e até municipais, esse ‘inferno’ de várias esferas de poder que o secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, experimentou. O fato é que o país perdeu uma grande chance de se mostrar ao mundo como uma potência emergente devido a seus próprios defeitos, turbinados pelo populismo no poder.

“A constatação não decorre de complexo de vira-lata, mas, ao contrário, da rejeição da fantasia marqueteira de um governo que vende um país que não existe, em vez de tentar mudar sua realidade. E que agora, depois do leite derramado, quer usar o patriotismo como refúgio de seus próprios erros.” (Merval Pereira, O Globo, 29/5/2014.)

Tudo errado na condução da economia

* É estranho ver aqueles que hostilizavam as políticas econômicas dos governos militares quererem repeti-la tanto tempo depois. Hoje o governo vislumbra o futuro olhando pelo retrovisor.

“Neste início de século, o governo busca seguir o velho modelo econômico do nacional-desenvolvimentismo, que prevaleceu entre 1930 e 1980. Foram 50 anos em que o País se voltou para dentro, cresceu aceleradamente e se industrializou. As características principais desse modelo eram a forte presença estatal nos investimentos, o controle cambial e as reservas de mercado, as restrições às importações, o crédito subsidiado para grandes empresas e o Estado investindo e operando indústrias e infra-estruturas de serviços básicos. Três mecanismos garantiam recursos para os investimentos: inflação, fundos vinculados a tributos setoriais e endividamento externo. A inflação, ao final, representou uma brutal transferência de renda dos mais pobres para o Estado e para os grandes grupos empresariais, agravando mais a concentração de renda.

“O nacional-desenvolvimentismo foi bom enquanto durou. O contexto mundial era outro, uma vez que prevalecia o protecionismo, a maior presença estatal nas infra-estruturas, o descontrole dos gastos públicos e a inflação. No entanto, o mundo mudou com o aprofundamento da globalização. Houve o espalhamento de novas cadeias produtivas transcendendo fronteiras, a decorrente redução das barreiras comerciais e o combate aos desequilíbrios fiscais e à inflação, para possibilitar os avanços na produção e nas trocas em escala mundial. Sempre a reboque das mudanças, a quebra do modelo, nos anos 80, impôs ao Brasil uma longa e sofrida transição. Com atraso, teve de se adaptar ao novo contexto para poder ser um ator de importância na economia globalizada. Por isso, foi fundamental quebrar as barreiras comerciais e instituir o tripé macroeconômico de apoio à mudança para uma economia mais aberta e competitiva. Passamos a ter a gestão coordenada do superávit primário, câmbio flutuante e regime de metas da inflação. O Brasil ganhou estabilidade monetária e maior inserção na economia mundial.

“Se a indústria, como um todo, não soube enfrentar a competição externa – seja por estar viciada no protecionismo, seja por ter baixos níveis de competitividade e frágil desenvolvimento tecnológico -, não será o retorno às proteções que a tornará mais competitiva. Os exemplos da prosperidade do agronegócio e da mundialização de certos segmentos industriais brasileiros mostram que houve alternativas. Por outro lado, se a falência do Estado nos anos 80 nos impôs infra-estruturas precárias e insuficientes, a recuperação veio após a instituição das concessões ao setor privado. Portanto, não será com maior carga tributária e inflação que o Estado retornará à ‘época de ouro’ de seu domínio sobre a economia. O Estado brasileiro é perdulário, incompetente, fortemente controlado por grupos políticos e, portanto, atrasado e corrupto em sua essência. Esperar que venha a comandar o crescimento econômico daqui para a frente – como o fez no passado – é esquecer o velho preceito marxista de que a História se repete como farsa. Ou como tragédia, se a inflação desandar e os investimentos encolherem ainda mais.

“O mais curioso nessa guinada para o nacional-desenvolvimentismo é essa espécie de ‘síndrome de Estocolmo’ econômica. Os governos militares levaram ao auge o nacional-desenvolvimentismo, ironicamente aprofundando e ampliando parâmetros que vinham das épocas de Vargas e Kubitschek. O fechamento da economia, a industrialização a qualquer custo e o descaso com a inflação dominaram o pensamento econômico. Inegavelmente, o País deu um enorme salto para a contemporaneidade, pois poucos países cresceram aceleradamente como o Brasil, entre 1930 e 1980. Mas os anos 80 e 90 já indicavam a falência desse modelo econômico autárquico, não apenas diante das grandes mutações da economia mundial, mas também diante do quadro de hiperinflação associada à estagnação da economia por mais de duas décadas. É estranho ver aqueles que hostilizavam as políticas econômicas dos governos militares quererem repeti-la tanto tempo depois. Hoje o governo vislumbra o futuro olhando pelo retrovisor.” (Josef Barat, economista, Estadão, 24/5/2014.)

* A repetição é a regra do governo. E aí os números ruins vão se repetindo, e a ciranda só será rompida se houver um desastre

“No filme Feitiço do Tempo, de 1993, um repórter especializado em meteorologia vai a uma pequena cidade para cobrir a celebração do Dia da Marmota. Nessa data, 2 de fevereiro, a reação do bicho ao sair da toca para a luz do dia indica se o inverno logo terminará ou vai durar pelo menos mais seis semanas. Essa é a crença tradicional. Terminado o trabalho, o repórter quer partir, mas fica preso na cidade, numa armadilha de cenas repetidas. O noticiário econômico no Brasil é cada vez mais parecido com a história de Groundhog Day, título original do filme. O governo vai mais uma vez maquiar suas contas com receitas excepcionais, segundo confirmou o Ministério do Planejamento na revisão bimestral do Orçamento. A inflação anual continua rodando em torno de 6%. O déficit em conta corrente permanece na vizinhança de 3,6% do produto interno bruto (PIB) em 12 meses. O País mais uma vez apareceu numa das últimas posições – 54.ª em 60 – numa classificação de competitividade. O crescimento econômico projetado pelo governo, 2,5%, na revisão orçamentária, é mais uma vez um pouquinho melhor que o do ano anterior e, de novo, maior que o estimado pelos economistas fora do setor público.

“Também como de costume, o Ministério do Planejamento elevou a inflação projetada para o ano, desta vez de 5,3% para 5,6%. A projeção, como sempre, é mais otimista que a do pessoal do mercado financeiro e das consultorias. Como sempre, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, festeja as poucas novidades positivas e anuncia inflação em queda nos meses seguintes. Mas tudo indica uma repetição mais ampla da história bem conhecida.

“Os números mais recentes, o IPCA-15, oficial, e o IPC-S, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), apontaram algum recuo nas últimas semanas. O IPCA-15, divulgado no dia 21, caiu de 0,78% em abril para 0,58% em maio. A queda parece um excelente sinal. Mas o índice de difusão ainda mostrou aumentos em 67,4% dos preços cobertos pela pesquisa. Mesmo com menor pressão dos alimentos, a contaminação permanece muito ampla. O IPC-S, anunciado no dia 23, recuou de 0,78% na segunda para 0,69% na terceira quadrissemana de maio. As médias mensais de aumento dos principais índices de preços ao consumidor continuam acima de 0,5% ao mês – acima, portando, de 6% ao ano. O comentário é o mesmo: falta muito para se alcançar um ritmo civilizado de remarcação de preços.

“Além disso, os analistas foram unânimes ao negar qualquer surpresa. Essa evolução era esperada e, além disso, muito parecida com a observada em outras ocasiões. As projeções coletadas pelo Banco Central (BC) indicam recuo das taxas mensais até agosto e em seguida uma reaceleração. Na hipótese mais otimista, os aumentos de juros acumulados a partir de abril do ano passado começam a fazer efeito, impondo freio ao consumo privado. Mas isso, por enquanto, é só uma hipótese.

“Além do mais, as contas públicas, um dos principais fatores inflacionários, continuam em mau estado. O governo planeja fechar as contas, mais uma vez, com receitas de concessões, dividendos de estatais e mais uma rodada de pagamentos do Refis, o programa de refinanciamento de dívidas tributárias.

“Nada de novo nessa frente. Concessões e dividendos devem render juntos, neste ano, pelo menos R$ 37,4 bilhões. Só isso representa 46,3% do superávit primário de R$ 80,8 bilhões programado para o governo central. Somado o dinheiro do Refis, o total vai além de 70%. Austeridade fiscal? Nem pensar. Também nisso a história se repete, como se o tempo estivesse enfeitiçado.

“A repetição é a regra também no conjunto das contas externas. Desde agosto do ano passado o déficit em conta corrente acumulado em 12 meses permanece na vizinhança de 3,6% do PIB. A conta corrente é a soma algébrica da balança comercial, da balança de serviços e rendas e das transferências unilaterais. O déficit final de 2013 chegou a US$ 81,07 bilhões, 3,62% do PIB. O acumulado nos 12 meses até abril bateu em US$ 81,61 bilhões, 3,65% . Para o ano o BC projeta um buraco de US$ 80 bilhões, 3,59% do PIB.

“O problema principal, como nos últimos seis anos, é a deterioração do comércio de mercadorias. De janeiro a abril o resultado foi um déficit de US$ 5,57 bilhões, com recuo tanto das exportações quanto das importações. Nas três primeiras semanas de maio houve alguma melhora, mas o acumulado no ano ainda foi um déficit de US$ 4,78 bilhões. Como ocorre há muitos anos, só as exportações de minérios e do agronegócio evitaram um rombo maior. De janeiro a abril o agronegócio contabilizou um superávit de US$ 24,14 bilhões, 0,2% menor que o de um ano antes por causa do recuo de alguns preços. Mas o déficit do conjunto dos manufaturados e semimanufaturados foi mais que suficiente para anular esse resultado e ainda produzir um déficit geral na conta de mercadorias.

“Aí aparece, de novo, o problema da competitividade. O agronegócio tem sido capaz de enfrentar os muitos obstáculos da logística, da tributação e outros obstáculos característicos da economia brasileira, mas a maior parte da indústria continua travada pelas ineficiências do ambiente econômico e pelos próprios problemas de produtividade. Feito o balanço geral, a posição do Brasil na pesquisa anual do International Institute for Management Development (IMD), da Suíça, parece muito natural. Numa lista de 60, o País só fica acima de Eslovênia, Bulgária, Grécia, Argentina, Croácia e Venezuela. Em melhores posições aparecem o Chile (31.ª), o México (41.ª), o Peru (50.ª) e a Colômbia (51.ª). Os demais Brics – China, Rússia, Índia e África do Sul – também superam o Brasil.

“Se depender da política econômica, ninguém deve esperar grande mudança da história neste ano. Mas se faltar coragem ou competência para a busca de um novo rumo, a repetição será substituída por uma piora do enredo. A marmota, podem acreditar, será inocente.” (Rolf Kuntz, Estadão, 24/5/2014.)

* Ao longo do governo Dilma, o Brasil perdeu 16 posições em ranking de competitividade e se tornou uma das dez economias menos eficientes

“Mesmo nos bons momentos em que, com exagero, o país era visto do exterior como se estivesse na porta de entrada do bloco das economias desenvolvidas, algumas fragilidades persistiam em campos estratégicos. Educação, um deles, bem como na infra-estrutura e em vários itens que compõem o que se chama de ‘ambiente de negócios’ — burocracia, tributos, entre outros itens.

“O governo Dilma tentou aplicar um modelo, batizado de ‘nova matriz econômica’, pelo qual a produção seria puxada pelo consumo, sem se abrir espaço ao setor privado nos investimentos, e ainda fazendo-se pouco caso do equilíbrio fiscal, logo, da inflação. Não deu certo. O governo tentar refazer o caminho nos investimentos, mas a inflação se firma como destaque na lista de problemas graves, enquanto o crescimento do PIB se mantém anêmico. Os velhos problemas persistem e eles estão expostos no último ranking de competitividade, referente a 2014, montado pelo International Institute for Management Development (IMD), com apoio no Brasil da Fundação Dom Cabral.

“Neste levantamento, o país perdeu mais três posições e está em 54ª lugar numa relação de 60 economias. Ou seja, o Brasil é um dos dez piores em poder de competição no mundo.

“Tudo muito coerente com os resultados obtidos, por exemplo, na balança comercial, em que a queda das cotações mundiais de commodities e elevação das importações de combustíveis nem de longe são compensadas pelas vendas de manufaturados. Nestas, os problemas da baixa competitividade do país são visíveis.

“É sugestivo que nos últimos quatro anos — período no qual foi testada a ‘nova matriz’ —, o Brasil haja perdido 16 posições no ranking do IMD, e hoje esteja à frente apenas de Eslovênia, Bulgária, Grécia, Argentina, Croácia e Venezuela. Portanto, em más companhias, principalmente Argentina e Venezuela, aliados ideológicos de Brasília, em diversos estágios de uma crise econômica grave.

“Afetada pela má colocação do país em termos de gestão governamental (58º lugar), qualidade da infra-estrutura (52º) e inflação (54º), a eficiência empresarial caiu de 37ª para 46ª posição.

“Todo este cenário empurra o próximo governo para fazer reformas que destravem a economia — tributária, trabalhista, entre outras. Se não for estancada a tendência de os gastos em custeio cresceram sempre mais que a arrecadação e o PIB, em meio a um persistente intervencionismo governamental, os horizontes continuarão turvos e os investimentos, travados.

“A vantagem é que, segundo o IMD, o Brasil continua bem avaliado em tamanho da economia e poder de atração de investimentos diretos externos. Deve-se aproveitar enquanto é assim.” (Editorial, O Globo, 24/5/2014.)

* Combater o índice, e não a inflação, e dissimular custos com subsídio oriundo da dívida pública são casos exemplares da política econômica de puxadinhos

“O termo, tirado do glossário urbanístico da favelização, se encaixa à perfeição à forma como a economia tem sido gerenciada desde que a anabolização feita a partir de fins de 2009, no estouro da crise mundial, passou a não produzir os efeitos esperados.

“Os ‘puxadinhos’ começaram a ser construídos à medida que os problemas surgiam — como é da natureza dos ‘puxadinhos’. É parte da cultura do ‘puxadinho’ um estilo de ação do governo no varejo voltada a combater efeitos, e não causas. O setor energético é a grande cobaia deste tipo de ação.

“Se a inflação ameaça escapar do controle — por erros do governo no campo monetário e fiscal —, controlem-se tarifas de bens e serviços públicos. E assim os preços de combustíveis passaram a ser subsidiados pela Petrobrás, enorme sobrecarga para uma empresa que necessita investir pesadamente. Além de causar falências entre produtores de álcool.

“Cálculos de Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infra-estrutura, feitos ainda na primeira quinzena do mês, indicavam uma defasagem de 17% no preço da gasolina e 15% no diesel. Para minimizar as dificuldades da estatal, obrigada a importar mais caro e vender mais barato, outro ‘puxado’: aumento da mistura de biocombustível no diesel

“A tática míope de se administrar o índice de inflação em vez de se combater com o vigor necessário os motivos da elevação dos preços tem provocado um enorme estrago no setor elétrico.

“O objetivo era, e é, defensável: reduzir o custo da energia elétrica, um dos fatores negativos na já baixa capacidade de o Brasil competir no exterior e com os produtos importados. Ao se passar à prática, veio o desastre.

“Coerente com o seu viés intervencionista, pelo qual se tenta até tabelar lucro de empresa privada, o Planalto baixou por medida provisória um édito para que as empresas renegociassem suas concessões prevendo tarifas excessivamente baixas. Só as federais o fizeram, porque foram obrigadas.

“Com a seca e a necessidade de se manter as termelétricas em operação constante, tudo isso somado ao corte forçado de tarifas, criou-se enorme desequilíbrio financeiro no sistema, com a virtual quebra de distribuidoras.

“O resultado é que esse ‘puxadinho’ deverá custar no mínimo R$ 20 bilhões ao Tesouro. Sem considerar o mirabolante empréstimo bancário de R$ 11,2 bilhões à Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), entidade sem ativos para caucionar mesmo operações simples de crédito.

“Combater o índice de inflação, e não a própria, e dissimular custos com subsídios pagos por dinheiro oriundo de endividamento público — e não só no setor elétrico — são ‘puxadinhos’ exemplares. Assim como nas favelas, este é um tipo de solução de alto risco.” (Editorial, O Globo, 28/5/2014.)

A inflação

* O governo Dilma não combate a inflação. É complacente com ela. É amigo dela

“As primeiras teorias sobre a inflação eram como a cartografia primitiva: roteiros para a imaginação muito mais que representações científicas e confiáveis da verdadeira geografia. A inflação surgiu mais ou menos na mesma época e lugar que o ‘papel-moeda’, sendo muito natural e espontâneo que se associasse uma coisa à outra. Afinal, a inflação é a perda de poder aquisitivo da moeda, simples assim.

“No Brasil, entretanto, logo emergiu um visão alternativa e imaginosa que tomava emprestada à engenharia uma palavra que mudaria para sempre nossa maneira de olhar as mazelas da economia: dizia-se que a inflação brasileira era ‘estrutural’.

“Esse palavreado nos colocava em pleno Quartier Latin e, com toda razão, conferia a devida complexidade ao fenômeno, que deixava de pertencer às más intenções de governantes fabricantes de papel pintado e passava ao domínio de criaturas temíveis, como os monstros que ilustravam os espaços vazios dos mapas de antigamente: latifúndios, gargalos, cartéis e pontos de estrangulamento. Tinha-se, assim, de forma nem tão sutil, uma transferência da culpa pelo problema, um truque de grande impacto sobre os debates públicos sobre o combate à inflação.

“A ‘inflação estrutural’, em suas múltiplas encarnações, sempre compreendia uma variação recorrente de um preço importante, geralmente os de alimentos, mercê da (supostamente) baixa produtividade no setor causada pela estrutura agrária dominada pelo latifúndio, e da repercussão viciosa do ‘choque de oferta’ patrocinada pelos oligopólios e oligopsônios.

“Não era uma boa teoria, tanto que caiu para a gaveta das curiosidades próprias dos primeiros anos do fenômeno. Mas a mensagem central resultou duradoura: essa inflação que tinha ‘raízes no setor real’ deveria ser combatida através de reformas que atacassem ‘estruturas’, agrária ou de classes sociais, de tal sorte que parecia tolo pensar que a política monetária pudesse afetar o poder de compra da moeda. A estabilização apenas ocorreria com a reforma agrária, ou com o socialismo.

“O legado mais duradouro e popular da ‘teoria da inflação estrutural’ era tão simples quanto devastador: a (suposta) inutilidade das políticas de estabilização convencionais, argumento que ainda soa como poesia para os amigos da inflação.

“Poucos se dão conta da importância e da contundência desse drible dado pelos ‘estruturalistas’: nunca se fazia uma defesa aberta da inflação, mas um ataque às políticas monetárias ortodoxas e à austeridade. Em retrospecto, deveria ser claro que ‘o inimigo do meu inimigo é meu amigo’ e os ‘estruturalistas’ estavam trabalhando a favor da inflação, às vezes admitindo ‘expropriar os rentistas’ ou ‘tributar a riqueza ociosa’, um argumento que frequentemente se associava a lord Keynes.

“Porém, os ‘desenvolvimentistas’ sempre conseguiam se afastar da (autoria da) inflação, que se tornava, assim, uma criatura órfã, um mal impessoal, um cadáver sem o assassino para se tornar um inimigo público. Quem eram os amigos da inflação? Não deveria ser difícil apontar os culpados, mas o fato é que o Brasil nunca teve rosto para tornar o patrono da inflação. Quem percorrer os cadernos de imagens dos livros sobre a inflação, como o da jornalista Miriam Leitão, vai encontrar fotos de prateleiras vazias, máquinas de remarcação e cédulas cheias de zeros ou carimbos, mas nenhum economista desses que criticam os ‘métodos convencionais’ de combate à inflação.

“Em tempos mais recentes, os amigos da inflação ampliaram o arsenal de pretextos para a complacência com a inflação com uma espécie de ressurreição torta da ‘inflação estrutural’, eis que a inflação observada no segmento de serviços do IPCA – que está rodando na faixa de 10% anuais – estaria associada à ascensão da classe média, processo desejável, uma espécie de ‘inflação do bem’, refletindo fenômenos fora do alcance da política monetária. O inflacionismo estaria em busca de uma aliança com o politicamente correto.

“Há enorme heterogeneidade dentro de ‘serviços’ no IPCA, com uma infinidade de histórias sobre mercados específicos. Há fenômenos associados ao ciclo imobiliário (aluguel, condomínio, estacionamento), outras ao turismo (passagens aéreas, hotéis, motéis, espetáculos), e os serviços que incluem componentes digitais (celulares, internet, fotocópia). Há a ‘inflação médica’, decorrente de mais ‘tecnologia embarcada’, mas o setor seguramente possui economias de escala, o mesmo valendo para os serviços educacionais. E há os itens afetados pelo salário mínimo (consertos e serviços pessoais), e também a deflação dos eletrônicos (duráveis, ou mais baratos ou melhores).

“O que há de comum nesses enredos?

“Existem centenas, talvez milhares, de histórias de mudanças de preços relativos, vale dizer, sobre ‘inflação (ou deflação) estrutural’, pois o sistema de preços está sempre a vibrar, como um organismo vivo e irrequieto. Quem tem 50 teorias sobre inflação estrutural na verdade não tem nenhuma. Se existe algum traço comum em cada uma dessas narrativas de ‘choques de oferta’ é que todos os preços são na mesma moeda, que pode valer mais ou menos, dependendo da política monetária.

“A verdadeira discussão não é sobre se a inflação nos serviços é ‘benigna’, mas sobre complacência com a inflação. A alusão a uma nova inflação estrutural serve apenas para trazer de volta uma tese conhecida e maléfica: se há uma boa explicação ‘não monetária’ para a existência da inflação, segue-se que a política monetária não funciona, ou produz um desemprego desnecessário para corrigir o incorrigível.

“A própria presidente disse recentemente que reduzir a meta de inflação de 4,5% (na verdade 6,5%) para 3% faria o desemprego pular para 8% ou mais.

“De onde saiu essa matemática?

“Se fosse verdade, a redução na taxa de inflação de 916% para 5%, observada entre 1994 e 1997 (taxas acumuladas para o ano calendário), teria criado um caos. Em vez disso, o desemprego oscilou de 5,1% para 5,7%. Para quem não é do ramo parece mágica, não é mesmo?

“O fato é que as autoridades governamentais prosseguem com o velho truque de antagonizar o combate à inflação e não a inflação, assim se esquivando de fazer uma defesa aberta dessa sua criatura amiga, órfã apenas na aparência, que parece nascer de causas naturais sem que ninguém lhe dê o que comer.

“Quem são os amigos da inflação?

“Basta olhar para os inimigos do combate à inflação.” (Gustavo Franco, economista, Estadão e O Globo, 25/5/2014.)

* Inflação reduz em R$ 73 bilhões o consumo de brasileiros da chamada “nova classe média”

“A escalada da inflação atinge de forma perversa a parcela da população brasileira que ascendeu para a classe C e passou a consumir produtos e serviços antes inatingíveis. O dragão abocanhou R$ 73,4 bilhões desse grupo nos últimos 12 meses, segundo estudo do Instituto Data Popular, feito a pedido do Globo. A classe C movimenta cerca de R$ 1,17 trilhão por ano, calcula o instituto. Nos últimos 12 meses, a inflação acumula alta de 6,28%, pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). A mordida no orçamento só não foi mais doída porque a renda da classe C continuou a subir. No entanto, ainda em fase de expansão, a nova classe média já está dividida. Boa parte se encontra em uma ‘zona de rebaixamento’ e corre o risco de voltar à classe D por causa das condições da economia brasileira: combinação de inflação persistente e juros altos.

“Segundo uma estimativa construída pela corretora Gradual, dos 108 milhões de pessoas da classe C, cerca de 10 milhões estariam na fronteira da classe D e seriam mais vulneráveis a um rebaixamento. Elas ascenderam à classe média (grupo que, segundo os critérios da Data Popular, tem renda familiar de R$ 1.216 a R$ 4.256) com o aumento dos ganhos salariais no passado, mas ainda têm renda errante que pode diminuir ao sabor do quadro econômico.

“— O dilema na mesa do Banco Central é se deve controlar a inflação de serviços, que atualmente roda em 8,99%, por meio de uma elevação da taxa básica de juros a tal patamar que jogaria a nova classe C de volta ao subconsumo da classe D (com o aumento do juro, o crédito fica mais caro) — explica o economista-chefe da Gradual, André Perfeito.

“Na visão de Perfeito, o governo tem gasto além da conta e isso coloca combustível na inflação, que prejudica não apenas a classe média, mas principalmente os mais pobres.

“O presidente do Data Popular, Renato Meirelles, acrescenta que o debate tem de ser ainda mais amplo: a melhoria de vida da população passa necessariamente por aumento da produtividade e de investimentos.

“— Não dá para ficar apenas na corda bamba de segurar a demanda num país que tem demandas tão reprimidas como o Brasil — afirma Meirelles

“A assistente social carioca Cátia Soares de Sant’Anna trabalha em Angra dos Reis de segunda a quarta. As filhas ficam sob o cuidado da mãe dela no Rio. Desde o ano passado, diz que sentiu os preços subirem e alterou hábitos de consumo.

“— Antes eu fazia compras num mercado e só me preocupava com o produto. Hoje me preocupo com o valor. Compras, só no ‘dia da carne’ ou no ‘dia da fruta’. Vestuário também é preciso pesquisar. Não tem outra saída, tenho que planejar o que fazer com o salário — conta.

“E esse planejamento incluiu o lazer das filhas: evitar ao máximo gastar fora de casa é uma regra. Se a família sai, o lanche vai preparado na bolsa. Cátia tem renda de R$ 1.335 — era de R$ 7 mil até 2012, quando se separou e perdeu o emprego.

“Vaudiram Mendes Novais ganhava cerca de R$ 1.600 como garçom. Precisou sair do emprego e passar um tempo com a família na Bahia. Quando voltou para Brasília, não achou mais vaga em bares e restaurantes com o mesmo rendimento. Resolveu trabalhar como vendedor no quiosque de livros do cunhado e o salário caiu para R$ 1.200.

“— No supermercado, já senti o aumento dos preços e com a queda do meu salário cortei o supérfluo, como doces e biscoitos, e fiquei com o necessário: arroz, feijão e carne. E consegui baixar a conta do mercado de R$ 300 para R$ 200.

“Vaudiram não é o único que teve de ajustar as compras ao limite do orçamento. De acordo com o levantamento do Data Popular, 85% dos brasileiros acham que não conseguem ter mais o que adquiriam no passado com os mesmos recursos. Além de comprar menos, a pesquisa de preço voltou a ser tendência para os consumidores.

“— O brasileiro está mais criterioso e pesquisa mais preços na hora de comprar e isso não é só a classe C, é geral — diz Renato Meirelles.

“Segundo o Instituto Data Popular, 70% dos brasileiros apostam que os preços aumentarão ainda mais em 2014. E duas em cada três pessoas acham que não está fácil pagar as contas.

“Rochelle Matos é uma delas. Até melhorou de vida no último ano. Deixou de ser caixa de supermercado para vender artigos esportivos. O salário saltou de R$ 1.108 para cerca de R$ 1.500. O dinheiro, entretanto, parece estar mais curto. Na hora de listar o que deixou de comprar, ela dispara sem nenhuma dúvida:

“— Roupa e sapato! — conta antes de dar uma boa risada. — Isso era uma coisa que eu comprava muito mais antes.

“Já na família da recepcionista Kelly Lucy Pimenta, o corte no orçamento foi carnívoro. Ela, o irmão gari, a irmã manicure e a mãe podóloga tiraram a picanha do fim de semana da lista de compras. O contrafilé também desapareceu da geladeira. E sonhos de consumo foram adiados.

‘— Queria trocar de celular e comprar um tablet, mas só Deus sabe quando.

“Kelly está entre os 54% da população do país que fazem parte da classe média, segundo os critérios do Instituto Data Popular. Mesmo com os brasileiros que estão na zona de rebaixamento, a projeção é que essa camada da população aumente e chegue a 58% em 2023, ou seja, 125 milhões de pessoas.

“— Só que para caber mais gente no andar de cima da pirâmide social será preciso investir e estancar o processo inflacionário estrutural em curso— arremata o economista André Perfeito.” (Gabriela Valente com Clarice Spitz e Luciano Abreu, O Globo, 25/5/2014.)

* A gastança pública prossegue e o governo permanece dependente de receitas extraordinárias para alcançar a meta fiscal fixada para o ano

“Além de encarecer a vida dos brasileiros, a inflação pressiona também o custo da dívida pública e prejudica a saúde financeira do governo. Nos 12 meses terminados em abril, o custo médio da dívida pública federal (DPF) subiu de 11,46% ao ano para 11,52%, segundo informou o Tesouro Nacional. O custo médio da dívida pública federal interna (DPFi) também aumentou, passando de 11,03% para 11,13% ao ano. A dívida ficou mais cara porque cresceu a participação de títulos corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) e pela Selic, a taxa básica de juros. Essa taxa voltou a subir em abril do ano passado, quando os dirigentes do Banco Central (BC) decidiram intensificar o combate à alta de preços. Os investidores em papéis do governo tiveram um duplo estímulo para mudar suas preferências: tentaram defender-se da onda inflacionária e, ao mesmo tempo, aproveitar a remuneração maior oferecida pelos títulos vinculados à Selic.

“A taxa básica foi elevada em 9 ocasiões nos últimos 12 meses, mas a inflação continua bem acima da meta, de 4,5% ao ano, e resistente. Os índices de preços têm subido mais lentamente nas últimas semanas. Ao mesmo tempo, vêm-se multiplicando os sinais de enfraquecimento da economia.

“A demanda dos consumidores arrefeceu, o emprego tem crescido mais devagar e os indicadores de confiança dos empresários de vários setores pioraram. Diante desses sinais, analistas do setor financeiro passaram a apostar numa interrupção da alta de juros. Ainda hoje, no começo da noite, o Copom deverá anunciar uma nova decisão sobre os juros. Segundo a maior parte das previsões, os formuladores da política monetária deverão no mínimo iniciar uma pausa para avaliar os efeitos do aperto adotado nos últimos 12 meses.

“Se essa aposta estiver correta, o Copom atenderá aos principais porta-vozes do empresariado, críticos habituais dos aumentos de juros. Esses empresários normalmente se mostram muito mais preocupados com o custo dos financiamentos do que com a alta de preços, mesmo quando a inflação dispara e se distancia muito da meta, como ocorreu várias vezes nos últimos quatro ou cinco anos. A decisão apaziguadora também será provavelmente bem vista pelos ministros econômicos e pela presidente Dilma Rousseff, empenhada na busca da reeleição e na conquista da simpatia dos líderes empresariais.

“Se o Copom de fato interromper a alta da Selic, terá poucos meses para avaliar se o aperto iniciado há um ano de fato foi suficiente para frear a inflação. Pelas projeções correntes no mercado financeiro, a variação do IPCA deverá ser mais suave até julho ou agosto e em seguida ganhar novamente impulso. Na melhor hipótese, os preços continuarão subindo mais lentamente por um período mais longo e a inflação acumulada no fim do ano ficará abaixo de 6%. As projeções conhecidas até agora serão desmentidas e a política monetária poderá continuar mais frouxa do que nos últimos meses.

“Mas nada garante, por enquanto, esse bom resultado. Os consumidores estão mais cautelosos, neste momento, mas o desajuste entre a demanda total e a oferta no mercado interno dificilmente será superado a curto prazo. A indústria continua estagnada e o investimento privado será provavelmente insuficiente, nos próximos meses, para mudar o quadro. Além disso, a gastança pública prossegue e o governo permanece dependente de receitas extraordinárias para alcançar a meta fiscal fixada para o ano. Além disso, o governo já se comprometeu com novo aumento do salário mínimo e, além disso, a adoção de qualquer medida de austeridade, durante a campanha, será uma enorme surpresa.

“De toda forma, sobrou uma notícia boa no relatório divulgado ontem (27/5) pelo Tesouro. Entre dezembro e abril a dívida pública federal diminuiu 3,31%, de R$ 2,122 trilhões para R$ 2,052 trilhões. Só em abril o Tesouro resgatou um total de R$ 47,06 bilhões. Novas boas notícias poderão surgir, nos próximos meses, se a inflação recuar e o custo da dívida diminuir. Mas, por enquanto, essa expectativa parece otimista demais.” (Editorial, Estadão, 28/5/2014,)

As contas públicas desarranjadas

* Para poder fechar as contas, governo eleva previsão de receitas extraordinárias

“O governo federal aposta em uma arrecadação extra de R$ 24,3 bilhões em impostos neste ano para fechar a meta de superávit primário para as contas públicas, principal indicador sobre o desempenho da política econômica. Mais da metade desse valor, ou R$ 12,5 bilhões, devem entrar nos cofres federais com a aprovação do programa de refinanciamento de tributos atrasados, o chamado Refis, cuja reabertura está sob análise do Congresso Nacional.

“No ano passado, receitas não recorrentes totalizaram R$ 36 bilhões e foram cruciais para atingir a meta para as contas públicas. Em 2014, o governo espera poupar ao todo R$ 99 bilhões, equivalente a 1,9% do Produto Interno Bruto (PIB), para pagar juros da dívida.

“ A arrecadação extra anunciada ontem (22/5) pelo governo sofreu revisão em relação ao decreto anterior, publicado há dois meses. Naquela ocasião, o governo esperava R$ 18,744 bilhões em receitas extraordinárias. Sobre este número, foram adicionados os recursos que virão com o Refis. Mas, ao mesmo tempo, o baixo desempenho da economia obrigou os técnicos do Planejamento a cortarem a estimativa de arrecadação com outros impostos. A fotografia do momento, definida no decreto que será publicado hoje, mostra arrecadação extra de R$ 24,3 bilhões.

“ Para cumprir a meta de superávit primário, além dos recursos do Refis, o governo também conta com outras duas fontes importantes. A previsão de arrecadação com as concessões de serviços públicos, segundo os dados do governo, é de R$ 13,5 bilhões. E as estatais devem contribuir com R$ 23,9 bilhões em pagamentos de dividendos. Com isso, praticamente metade do chamado esforço fiscal do governo neste ano virá dessas três fontes.

“O novo decreto com a programação do Orçamento para este ano também vai na contramão do discurso oficial sobre o desempenho da economia. Um dia depois de o ministro da Fazenda, Guido Mantega, dizer que a inflação vai continuar caindo nos próximos meses, o governo elevou de 5,3% para 5,6% a estimativa para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2014.

“‘A estimativa de inflação (IPCA) é compatível com a meta estipulada para fins de política monetária e com a trajetória para este índice observada até o momento’, diz o relatório.

“O horizonte de uma recuperação econômica mais forte, presente nos discursos de Mantega e da presidente Dilma Rousseff, também não entrou no decreto do Orçamento. Depois de uma expansão de 2,3% no ano passado, o PIB deve crescer 2,5% neste ano, segundo o decreto que repete a mesma estimativa feita há dois meses. Mantega já chegou a prever 2,3% para este ano.

“O governo deixou de fora do documento atual a projeção de déficit da Previdência Social. No último relatório, estava em R$ 30 bilhões, mas esse número foi considerado baixo por analistas de mercado.” (Renata Veríssimo, Estadão, 23/5/2014.)

* Mais maquiagem nas contas

“O governo vai depender mais uma vez de receitas extraordinárias para fechar suas contas e entregar o resultado fiscal prometido para este ano, um superávit primário de R$ 80,8 bilhões no balanço conjunto do Tesouro Nacional, do Banco Central e da Previdência. O superávit primário é o dinheiro separado para o pagamento de uma parte das obrigações da dívida pública.

“Sem disposição para economizar e racionalizar os gastos, a equipe econômica tem recorrido, nos últimos anos, a soluções heterodoxas para atingir a meta oficial. Essa disposição é ainda mais duvidosa em ano de eleição. Mas o compromisso tem sido reafirmado. A promessa, no entanto, vai além daqueles R$ 80,8 bilhões. A economia total fixada para o ano, de R$ 99 bilhões, dependerá, segundo o plano original, da contribuição de Estados, municípios e empresas controladas pela União. Se a contribuição efetiva ficar abaixo da programada, a diferença será coberta por um esforço maior das entidades federais, segundo anunciou há meses o ministro da Fazenda, Guido Mantega.

“O uso de dinheiro extraordinário para fechar o balanço foi confirmado no relatório de avaliação orçamentária do segundo bimestre, divulgado na quinta-feira (22/5) pelo Ministério do Planejamento. A cada reavaliação o governo atualiza a programação de receitas e de despesas, com base na evolução recente das contas públicas e nas últimas projeções econômicas. As projeções incluídas no relatório mantêm a perspectiva de crescimento de 2,5% para o Produto Interno Bruto (PIB) e elevam a inflação de 5,3% para 5,6%.

“O ritmo da atividade pouco deverá contribuir, portanto, para a geração de receitas. Além disso, a expansão projetada de 2,5% está acima das previsões do mercado, em geral inferiores a 2%, mas esse detalhe é desconsiderado, obviamente, nas estimativas oficiais. A inflação poderá elevar a receita nominal, a curto prazo, mas isso dependerá da confiança de empresários e consumidores, neste momento em deterioração.

“Por enquanto, pioram as projeções da receita tributária normal. Diminuíram na segunda revisão os valores previstos para os Impostos de Renda, de Importação e sobre Produtos Industrializados. Aumentou a dependência de recursos extraordinários, mas as contas mostram um resultado final ajustado. O valor estimado para a arrecadação extraordinária de impostos passou de R$ 18,7 bilhões para R$ 30,2 bilhões em todo o ano. O aumento inclui o ganho previsto como resultado de uma reabertura do Refis, o programa de refinanciamento de tributos em atraso.

“No ano passado o Refis também foi reaberto – mais uma vez – e os primeiros pagamentos ajudaram a ajeitar as contas de 2013. Em geral, a arrecadação proporcionada por esse programa tende a decrescer em pouco tempo e boa parte das empresas beneficiadas simplesmente deixa de cumprir as obrigações.

“As receitas extraordinárias incluem também um bom volume de bônus de concessões de infra-estrutura e dividendos de estatais. As estimativas indicam R$ 13,5 bilhões de bônus de concessões e R$ 23,9 bilhões de dividendos.

“De janeiro a março, os dividendos, no valor de R$ 5,9 bilhões, foram 667,6% maiores que os de um ano antes. O governo está obviamente cobrando um esforço especial das estatais para ajeitar as contas do Tesouro. No ano passado essa contribuição, somada à receita das concessões, foi fundamental para a apresentação final das contas. O trabalho de maquiagem, também conhecido como contabilidade criativa, foi apontado pela imprensa e por analistas do mercado. Já havia ocorrido no ano anterior e comentários sobre o assunto apareceram na imprensa internacional.

“Em resumo: pelo novo relatório de avaliação bimestral, ninguém deve esperar cortes adicionais de despesas nos próximos meses. Além disso, falta o governo esclarecer alguns mistérios. Não há referência, no documento, ao déficit projetado para a Previdência nem ao custo do subsídio às contas de luz. A melhora das contas públicas, têm dito dirigentes do Banco Central, seria uma contribuição importante para o combate à inflação. Eles terão de continuar esperando essa contribuição.” (Editorial, Estadão, 26/5/2014.)

* Segundo o Tribunal de Contas, 28% do balanço financeiro do governo tem distorções graves

“O Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu que 28% do valor total de ativos e passivos do balanço da União tem distorções graves, o que compromete a credibilidade das demonstrações contábeis do governo. Segundo o relator do processo, ministro Raimundo Carreiro, são problemas que precisam ser corrigidos, uma vez que o patrimônio líquido da União pode estar superavaliado em mais de R$ 2 trilhões.

“De acordo com Carreiro, o governo não evidencia despesas futuras com o regime próprio de previdência, militares inativos, pensionistas militares e regime geral da previdência social. Isso significa que o passivo real do governo pode ser muito superior ao divulgado. ‘O balanço fica incompleto, pois não temos o potencial de despesas para os próximos anos’, afirmou.

“Na avaliação do presidente do TCU, Augusto Nardes, é fundamental levantar essas informações, uma vez que o governo gastou R$ 455 bilhões no ano passado apenas com previdência e assistência social.

“Outro exemplo mencionado por Carreiro foram distorções nos preços de imóveis. Em um dos casos, foi encontrada uma sobreavaliação em um imóvel da Universidade Federal do Piauí superior a R$ 2 milhões.

“Carreiro criticou também o crescimento dos restos a pagar. ‘É praticamente um orçamento paralelo, e o governo chega a acumular quatro’, afirmou.

“O alerta para essas distorções no balanço da União faz parte do conjunto de ressalvas feito pelo TCU às contas da presidente Dilma Rousseff relativas a 2013. Nesta manhã, o tribunal recomendou ao Congresso Nacional a aprovação das contas, mas emitiu 26 ressalvas ao documento. O parecer do TCU serve de subsídio ao julgamento político das contas do governo, a cargo do Congresso. Se as recomendações não são atendidas, o TCU pode recomendar ao Congresso que rejeite as contas. O Congresso, porém, não analisa as contas presidenciais desde o último ano do governo Fernando Henrique Cardoso.

“Carreiro defendeu ainda a autonomia formal do Banco Central (BC). Ao apresentar o relatório de análise das contas do governo, Carreiro destacou que o centro da meta da inflação somente em 2009. ‘De lá pra cá, sempre ficamos acima. A autoridade monetária tem que ter autonomia para conduzir a política monetária com total independência’, afirmou.” (Anne Warth, Estadão, 29/5/2014.)

Problemas na área do emprego

* A taxa de desemprego é baixa não porque aumentam os postos de trabalho, mas porque menos pessoas procuram trabalho

“O desemprego no Brasil alcançou em abril apenas 49 em cada mil trabalhadores, nível mais baixo em meses de abril desde 2002, quando começou a medição com a metodologia hoje adotada.

“Já seria um dado intrigante, apenas se contraposto ao avanço econômico medíocre dos últimos quatro anos, à baixa disposição da indústria em contratar pessoal e à diluição do poder aquisitivo pela inflação.

“Mas é ainda mais intrigante na medida em que esse recorde está sendo atingido não porque tenham aumentado os postos de trabalho no País, mas porque cada vez menos brasileiros se dispõem a procurar emprego.

“Não falta quem diga, como o presidente da Fifa, Joseph Blatter, disse dia 16, que brasileiro não quer trabalhar. Como ninguém vive de vento e como essa queda do índice de ocupação é relativamente recente – porque quase sempre o desemprego foi mais alto do que é hoje – é preciso explicação.

“Muito já foi dito sobre a necessidade de mais instrução e de mais treinamento prévio, exigências que vêm adiando a entrada dos jovens no mercado de trabalho. (Também segue sendo repisado que cada vez mais aposentados têm de continuar trabalhando porque os proventos da Previdência são insuficientes.)

“Por outro lado, é notório o aumento de renda da população, graças em parte aos programas distributivos do governo. E, ainda, estão aí as conclusões das pesquisas de que, nos últimos 15 anos, pelo menos 30 milhões de brasileiros chegaram a segmentos mais altos de consumo.

“Outra parte das explicações parece relacionada ao mais forte crescimento do segmento de serviços. Este não é apenas o setor que mais oferece empregos no Brasil, mas, também, o que mais proporciona remunerações extras por pequenas atividades, muitas vezes a quem já tem ocupação fixa. É a empregada doméstica que aceita serviços de faxina; é o eletricista que trabalha ‘por conta própria’; é o guardador de carros que ganha mais com o que faz do que se tivesse um emprego numa firma, onde o salário está sujeito a descontos de lei, além das despesas com transporte que, de resto, consome horas por dia, em trens ou ônibus cujos níveis de conforto conhecemos.

“Por aí se vê, também, que, na percepção do brasileiro comum, ter um emprego firme nem sempre compensa. É também o que se pode chamar de ‘precarização do trabalho’. Alguns analistas chamam a atenção para o tal fator de desalento, que leva o trabalhador a desistir de procurar emprego. Nenhum desses fatores isolados explica tudo. É na combinação entre eles que se pode procurar a explicação por esse fenômeno relativamente novo na economia.

“Até agora, a queda ou a manutenção do desemprego em níveis tão baixos deixaram estressado o mercado de mão de obra e concorreram para elevar os custos do fator trabalho. Mas já é acentuada a desaceleração da atividade econômica, a ponto de atingir em cheio até mesmo o setor de serviços. É uma pulsação bem mais fraca que pode voltar a acelerar os índices de desemprego.” (Celso Ming, Estadão, 23/5/2014.)

* O modelo em vigor nos últimos anos desmoronou

“Como o ornitorrinco, a economia brasileira é uma aparente aberração, formada pela surpreendente combinação de baixo desemprego, indústria estagnada, crescimento econômico pífio e inflação muito alta pelos padrões internacionais. Apesar de improvável, esse conjunto é tão real quanto o mais estranho dos mamíferos – um bicho ovíparo, com bico de pato, patas com membranas, rabo de castor e grande capacidade de movimentação na água. Diferença principal: no ornitorrinco, o conjunto funciona. No Brasil, a soma daqueles componentes resulta na síndrome de uma economia em muito mau estado.

“Na retórica da presidente Dilma Rousseff e de sua equipe econômica, a história é muito diferente. O baixo desemprego – aquele indicado pela pesquisa mensal em seis regiões metropolitanas – é apontado como prova do sucesso da política econômica. Examinados com um pouco mais de atenção, os fatos se revelam muito menos positivos.

“Em abril, o desemprego ficou em 4,9% nas seis áreas cobertas pela pesquisa tradicional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essa taxa, uma das mais baixas do mundo, foi ligeiramente inferior à de março, 5%, e bem menor que a de um ano antes, 5,8%. A massa de renda real dos ocupados diminuiu 0,5% de março para abril, mas ainda foi 3,6% maior que a de abril de 2013. O aumento da massa de renda real, somado à expansão do crédito, sustentou durante anos um bom volume de consumo.

“Mas o quadro do emprego é surpreendente por mais de uma razão. Uma delas é o baixo ritmo de crescimento da economia. Outro detalhe intrigante é a escassa criação de empregos observada já há algum tempo. Em relação a março a população ocupada nas seis áreas metropolitanas aumentou apenas 0,1%, com a criação de 17 mil postos de trabalho. A mesma variação, de 0,1%, ocorreu em relação a abril do ano passado. Como a população em idade ativa continuou em crescimento e a proporção de desocupados diminuiu, a parcela dos inativos deve ter aumentado. Os inativos – 19,19 milhões em abril – foram 0,6% mais numerosos que em março. Em relação a um ano antes, a expansão foi de 4,2%.

“Há um cenário de estabilidade na ocupação, comentou a especialista Adriana Araújo Beringuy, da Coordenação de Trabalho e Rendimento do IBGE. A taxa de desemprego, explicou, caiu porque houve redução das pessoas em busca de trabalho, sem ter havido geração significativa de postos de trabalho.

“O encolhimento da população ativa e, portanto, do pessoal em busca de emprego tem sido observado há algum tempo. Especialistas têm proposto várias explicações, como aumento da renda familiar, menor presença de mulheres, jovens e idosos no mercado e também mudanças na dinâmica demográfica.

“Mas há outros componentes importantes, e muito menos positivos, na recomposição desse mercado. A perda de qualidade do emprego é um dado cada vez mais evidente. Entre março e abril foram eliminados 69 mil postos na indústria. O pessoal ocupado no setor diminuiu 1,9% de um mês para outro e ficou 2% abaixo do total computado em abril de 2013. Além disso, em abril houve corte de 0,9% na construção. Em um ano a redução do pessoal empregado chegou a 3,1%.

“A criação de postos ocorreu no comércio, nos empregos domésticos e em várias outras categorias de serviços, privados e públicos. Movimento parecido foi revelado pela nova atualização do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho. O saldo líquido de empregos formais em abril – 105,3 mil em todo o País – foi o menor desde 1999. Além disso, o emprego industrial diminuiu tanto em relação a março quanto em relação a abril do ano anterior.

“A deterioração da qualidade do emprego está obviamente associada à estagnação da indústria. Além disso, a criação de postos tem dependido, principalmente, dos serviços e dos estímulos ao consumo. Sem crescimento industrial e com as exportações muito fracas, também os serviços e o varejo começam a perder impulso, como indicaram as últimas pesquisas do IBGE. Desmorona o modelo em vigor nos últimos anos.” (Editorial, Estadão, 23/5/2014.)

Falta confiança

* Índice de Confiança do Empresário Industrial tem o pior resultado desde janeiro de 2009

“O pessimismo do setor manufatureiro aumentou ainda mais nas últimas semanas, segundo pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) realizada entre os dias 5 e 14 deste mês. O Índice de Confiança do Empresário Industrial (Icei) caiu de 49,2 pontos, em abril, para 48 pontos, em maio – nos dois casos abaixo da média de 50 pontos. Ou seja, o grau de pessimismo superou o do otimismo pelo segundo mês consecutivo.

“Foi o pior resultado desde janeiro de 2009, ano em que a economia passou por uma recessão (o PIB caiu 0,3%), puxado pela indústria, que declinou 7,3%. Neste mês, apenas 5 dos 38 setores ou subsetores analisados revelaram otimismo, 2 não responderam e 31 declararam-se pessimistas, num levantamento feito com 2.582 indústrias de todo o País, de pequeno (969 companhias), de médio (996) e de grande portes (617 empresas).

“A queda em relação a maio de 2013 foi de 13,3%. Naquele mês, nenhum setor estava pessimista e o mais otimista era o farmacêutico, com pontuação de 61,7 pontos (neste mês, esse setor continua liderando o otimismo, mas a pontuação caiu para 56,6, queda de 8,2%).

“Até a indústria da construção, que mostrou mais otimismo nos últimos anos – com 55,4 pontos, em maio de 2013 -, chegou neste mês ao patamar negativo, com 49,9 pontos. No subsetor de construção de edifícios – em especial, para moradia – ainda há otimismo, mas a pontuação de 50,9 pontos é 7% inferior a um ano atrás. E a queda foi abrupta nas obras de infra-estrutura (de 57,3 pontos para 48,2 pontos).

“O pessimismo é especialmente forte nas indústrias de extração de minerais metálicos, madeira, biocombustíveis, informática, ópticos e eletrônicos, máquinas e materiais elétricos, máquinas e equipamentos, veículos automotores e outros equipamentos de transportes, todas com pontuação inferior a 45 pontos. E agudo na indústria da borracha (37,6 pontos). A prévia do Índice de Confiança da Indústria (ICI, da FGV) confirmou, ontem, o pessimismo constatado pela CNI.

“Na tentativa de reanimar a produção, o governo já utilizou o instrumental de estímulos de que dispunha, como os incentivos fiscais e o crédito subsidiado. Segundo o Ministério do Trabalho, a indústria de transformação cortou 3.427 postos de trabalho em abril. E o ritmo industrial poderá cair mais se a evolução da economia global for insatisfatória, restringindo mercados de exportação de bens brasileiros.” (Editorial, Estadão, 23/5/2014.)

* Índice de confiança do consumidor cai ao nível de 2009

“Diante da percepção de piora na economia e sem perspectiva de recuperação nos próximos meses, a confiança do consumidor caiu 3,3% em maio em relação a abril, segundo indicador da Fundação Getulio Vargas (FGV). A preocupação é com o aumento do endividamento e da inflação e o encarecimento do crédito. Além disso, as famílias se mostram cada vez menos otimistas em relação ao mercado de trabalho.

“O Índice de Confiança do Consumidor (ICC) caiu para 102,8 pontos e atingiu o menor nível desde abril de 2009, quando estava em 99,7 pontos. Além disso, a queda foi a mais intensa desde agosto de 2011 (-5% em relação ao mês anterior).

“‘Os quesitos estão retornando ao nível que estavam logo após a crise. A diferença é que, naquela época, houve retomada rápida pelo consumo. Agora, não só os consumidores, mas os empresários também não têm expectativas positivas’, disse a economista Viviane Seda, coordenadora da sondagem.

“O Índice de Situação Atual (ISA) caiu 3,9% em maio, enquanto o Índice de Expectativa (IE) recuou 2,9%. A preocupação das famílias com sua situação financeira foi o que mais pesou na queda. ‘O resultado é realmente muito ruim. Ainda estava em um pessimismo moderado, mas aprofundou’, disse Viviane.

“As avaliações sobre a economia, que foram destaque nas divulgações dos últimos meses, passaram a ter um papel menor. Mesmo assim, continuaram deteriorando. Para 30,9% dos consumidores, a situação vai piorar no futuro, porcentual mais elevado desde dezembro de 2008.

“O pessimismo ainda afetou a intenção de compra de bens duráveis, que cedeu 3,7%. Os mais prejudicados foram os eletrodomésticos, os computadores e os móveis. Apesar disso, os eletroeletrônicos ainda podem contar com o lucro trazido pelo aquecimento na venda de TVs em função da Copa do Mundo.

“As dificuldades enfrentadas pela indústria atingiram a confiança do consumidor em relação ao emprego em maio. Na cidade de São Paulo, a avaliação do emprego atual piorou 2,4%. ‘O pessimismo com o mercado de trabalho em São Paulo ocorre justamente por conta da indústria’, disse Viviane.

“Na média do Brasil, a perspectiva para o emprego caiu 1,2%. O Rio de Janeiro é a única cidade que fugiu à tendência e apresentou queda menos intensa, de 0,9%, devido à concentração maior de ocupados no setor de serviços. ‘Os serviços ainda estão em momento favorável em questão de emprego, pelo menos mais do que na indústria’, disse Viviane.” (Idiana Tomazelli, Estadão, 24/5/2014.)

* Índice de confiança do consumidor cai 25% em um ano

“A confiança do consumidor paulistano despencou este mês. Em maio, o Índice de Confiança do Consumidor (ICC) da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio-SP) caiu 25% em relação a maio de 2013 e 9% na comparação com abril deste ano. Foi a maior retração anual da série histórica do indicador, que começou a ser apurado em julho de 1994. O índice, que hoje está em 109,5 pontos, encontra-se no menor nível desde outubro de 2005.

“‘A escalada do pessimismo é nítida e generalizada’, afirma o assessor econômico da Fecomércio-SP, Altamiro Carvalho. Ele observa que desde fevereiro do ano passado o ICC vem apresentando recuos em relação ao mesmo mês do ano anterior e que a dimensão da queda aumenta a cada mês.

“Na análise do economista, a persistência da inflação e o acúmulo de informações que indicam uma deterioração do cenário econômico são fatores que levaram ao resultado negativo.

“Um dado que chama atenção, segundo Carvalho, é que o comportamento dos dois indicadores que compõem o ICC mudou. Normalmente, o indicador de expectativas, que avalia a confiança do consumidor no futuro, isto é, num prazo de até cinco anos, é maior do que o indicador de confiança na situação atual. Neste mês, no entanto, a confiança do consumidor no futuro não só está mais baixa do que a atual, mas também teve maior queda.

“Em maio, o indicador de expectativa recuou 26,4% na comparação com o mesmo mês de 2013, enquanto o indicador de confiança na situação atual caiu 23% no mesmo período. ‘É o desalento do consumidor em relação à situação econômica no médio e longo prazos’, ressalta.

“A pesquisa da Fecomércio-SP, feita com 2,1 mil consumidores na cidade de São Paulo, mostra que a confiança é menor no resultado mensal entre a população com maior renda. Os paulistanos que recebem mais de dez salários mínimos tiveram redução de 16,3% no índice de confiança de abril para maio. Já os consumidores com renda mensal inferior a dez mínimos reduziram a sua confiança em 8,7% no último mês.

“As mulheres estão mais céticas em relação à economia e reduziram a confiança em 11,7% de abril para maio, enquanto entre os homens a queda foi de 9,6%. Para Carvalho, o maior recuo entre as mulheres reflete a pressão inflacionária.” (Márcia De Chiara, Estadão, 28/5/2014.)

Os números ruins da semana

* Contas externas têm o pior déficit da história no primeiro quadrimestre

“Um dos principais indicadores da saúde financeira de um país, as contas externas brasileiras tiveram déficit de US$ 33,476 bilhões de janeiro a abril deste ano, segundo dados do Banco Central. É o pior resultado da história. O montante corresponde a 4,65% do Produto Interno Bruto. O cálculo de contas externas inclui a balança comercial, a balança de serviços e remessas de lucros.

“Nos quatro primeiros meses do ano passado, o déficit chegara a US$ 32,939 bilhões – o equivalente a 4,55% do Produto Interno Bruto. Para 2014, o BC estima um saldo negativo acumulado de US$ 80 bilhões, ou 3,59% do PIB.

“Em abril, o déficit foi de US$ 8,291 bilhões, também recorde para o mês, e afetado por elevadas remessas de lucros e dividendos. Ao mesmo tempo, os investimentos produtivos que ingressaram no país, US% 5,233 bilhões em abril, não cobriram o rombo nas contas, algo que se repete desde novembro passado.” (Eliane Oliveira, O Globo, 24/5/2014.)

* Pesquisa mostra que as empresas com planos de investir vão desembolsar valor 4,7% menor que no ano passado

“O cenário incerto da economia, marcado por baixo crescimento do mercado doméstico e das exportações, provocou uma piora nas intenções de investimento da indústria. Pesquisa da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), obtida com exclusividade pelo Estado, mostra que um terço (33,5%) das empresas não pretende investir em 2014, o maior resultado em três anos. No ano passado, 19,9% estavam nessa condição.

“Entre as que vão investir, o desembolso será 4,7% menor neste ano e deve somar R$ 175,1 bilhões, o terceiro ano seguido de queda. Em 2013, os investimentos industriais somaram R$ 183,7 bilhões. A pesquisa consultou cerca de 1.200 empresas, de todos os portes, entre fevereiro e abril, e retrata a expectativa dos empresários da indústria nacional.

“A decisão de frear investimentos nas fábricas é confirmada pelo resultado do Índice de Confiança de Investimentos da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que caiu 6,7% em abril e teve o maior recuo desde janeiro de 2009, no auge da crise global.

“‘A expectativa de que a economia vai acelerar não é grande e há risco de racionamento de energia’, observa o superintendente adjunto de Ciclos Econômicos da FGV, Aloisio Campelo, responsável pelo indicador, que reúne as expectativas dos executivos dos setores ligados a investimentos – máquinas, construção civil, incluindo insumos e serviços de engenharia.

“‘Este ano, a perspectiva de crescimento é baixa, 2015 provavelmente será de ajuste e o mercado internacional está se recuperando numa velocidade muito menor do que se imaginava’, afirma José Ricardo Roriz Coelho, diretor do Departamento de Competitividade e Tecnologia, responsável pela pesquisa. Esses fatores explicam o recuo do investimento.

“Coelho destaca que a maior retração, de 7,2%, aparece nos investimentos em máquinas e equipamentos, que somam R$ 110,7 bilhões. Mas há recuos, porém menores, nos investimentos em gestão (-1,4%) e em pesquisa e desenvolvimento (-1,9%). O único setor no qual há intenção de aumento de investimento é o de inovação (2,2%).

“‘Os empresários estão fazendo investimento defensivo’, afirma Roriz. Isto é, eles não expandem a capacidade de produção, mas investem para fabricar com custo menor para manter sua participação de mercado.

“Alfredo Ferrari, diretor de vendas da Ergomat, fabricante de tornos e centros de usinagem – máquinas usadas por outras indústrias -, é um exemplo de empresário que optou pelo ‘investimento defensivo’. Nos últimos dez anos, a empresa investiu todos os anos na ampliação da produção. Mas, neste ano, não vai investir em aumento da capacidade e concentrou os recursos em inovação. Os desembolsos estão direcionados para desenvolvimento de uma máquina nova, de alta tecnologia, que chega ao mercado no começo de 2015. ‘Demos um trégua nos investimentos em capacidade por causa da situação de mercado’, diz Ferrari. No primeiro trimestre, a receita da empresa caiu 10% em relação igual período de 2013.

“Já a Asvac, fabricante de bombas para plataformas de petróleo, decidiu não investir em 2014. ‘Foi a primeira vez que isso aconteceu em 31 anos’, conta o sócio, Cesar Prata. No final de 2013, a empresa encolheu 20%, porque a Petrobrás ampliou as compras de fornecedores estrangeiros. E a decisão de não investir veio na sequência.

“No caso da Whirlpool, que fabrica eletrodomésticos das marcas Cônsul e Brastemp, os investimentos somarão R$ 500 milhões este ano, com alta de 15% em relação ao ano passado.

“Enrico Zito, presidente da unidade para América Latina, diz que os recursos serão aplicados em desenvolvimento de tecnologias e o reflexo deve aparecer nos resultados da companhia em dois ou três anos. ‘Quando planejamos os investimentos, assumimos que 2014 e 2015 seriam difíceis.’” (Márcia De Chiara, Estadão, 25/5/2014.)

* Pagamos R$ 105,8 bilhões ao governo federal em abril

“Apesar da queda de alguns tributos e das desonerações, o governo federal registrou em abril mais um recorde na arrecadação. Recolheu R$ 105,884 bilhões em impostos e contribuições, uma alta de 0,93% na comparação com o mesmo mês de 2013, já descontando a inflação. Em abril de 2013, foram arrecadados R$ 104,9 bilhões. No acumulado de janeiro a abril, o total recolhido foi de R$ 399,310 bilhões, também recorde para o período.

“Segundo a Receita Federal, as desonerações tributárias chegaram a R$ 8,86 bilhões em abril, principalmente com a folha de salários. No mesmo mês do ano passado, o valor foi de R$ 6,14 bilhões. No acumulado de janeiro a abril, a renúncia fiscal foi de R$ 34,97 bilhões, contra R$ 22,33 bilhões no primeiro quadrimestre de 2013.

“Além do impacto das desonerações, a Receita está preocupada com o fraco desempenho de tributos importantes, como o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL). Em abril, esses dois tributos mostraram recuperação, com crescimento de 12,38% ante abril de 2013. No entanto, no quadrimestre, a arrecadação registra recuo de 2,22% em relação ao mesmo período de 2013. Segundo o secretário adjunto da Receita Federal, Luiz Fernando Teixeira Nunes, empresas compensaram créditos a que tinham direitos no início do ano, principalmente em janeiro e fevereiro.

“- No primeiro trimestre, houve um severo impacto nos recolhimentos considerando as compensações. Em abril, esse cenário mudou. As compensações deixaram de impactar – disse o secretário.

“No caso da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), o recuo foi de 1,1% nos quatro primeiros meses, mas esse resultado foi influenciado, sobretudo, pela queda nas vendas de produtos e serviços em abril. Diante do resultado, o secretário revisou a previsão de alta real da arrecadação das receitas administradas.

“- Trabalhávamos com número de 3% a 3,5%. Hoje, trabalhamos com 3%. É uma pequena revisão – disse.

“De acordo com o secretário, a previsão de alta de 3% na arrecadação considera uma retomada da alíquota cheia do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para os automóveis em julho.

“Por outro lado, entre as receitas que registraram elevação no quadrimestre e contribuíram para o resultado recorde estão a receita previdenciária, com alta de 2,73% acima da inflação; e o Imposto de Renda sobre Rendimentos do Trabalho, com crescimento de 4,67%. A Receita destacou ainda o aumento de 2,32% nas vendas de produtos e serviços no quadrimestre, além de uma alta de 10,12% na massa salarial e de 2,38% no valor em dólar das importações. No caso do IPI de automóveis, houve alta de 17,78% decorrente, fundamentalmente, da recomposição gradual da alíquota incidente.” (Cristiane Bonfanti, O Globo, 27/5/2014.)

Os erros na área de energia

* Com consumo de combustíveis em alta, Petrobrás vai gastar US$ 18,8 bilhões este ano com importações, um aumento de 24%

“O aumento do consumo de combustíveis, estimado pelo mercado em cerca de 4% neste ano, vai se traduzir em mais gastos com as importações de derivados, principalmente de gasolina e diesel. Segundo projeções feitas pelo Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE), os custos com a compra desses produtos podem subir 24,5% em relação ao ano passado. O montante pode chegar a US$ 18,8 bilhões, maior que os US$ 15,1 bilhões de 2013, já descontados os cerca de US$ 4,5 bilhões referentes às compras externas de 2012 contabilizadas apenas no ano passado.

“O Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP) estima que a demanda por gasolina e óleo diesel crescerá 4%, mesmo nível do ano passado. O diretor do CBIE, Adriano Pires, diz que a expectativa é que as importações de derivados somem 462,2 mil barris por dia, 23,3% a mais que os 374 mil barris médios por dia de 2013. O consumo total de combustíveis deve ficar em 2,3 milhões de barris por dia, contra 2,2 milhões de barris um ano antes.

“Se por um lado a expansão das importações de derivados ainda pesará nas contas da Petrobrás, por outro o aumento de 7,5% na produção de petróleo esperado para este ano vai melhorar a geração de caixa da estatal. E para alcançar essa meta, considerada ‘agressiva’ pelo mercado, a Petrobrás vem trabalhando desde o ano passado para a instalação de 11 novas plataformas.

“Segundo a Petrobrás, as 11 unidades, que começaram a ser instaladas em janeiro de 2013 e serão concluídas até o fim deste ano, ampliarão a capacidade instalada em 1,3 milhão de barris de petróleo por dia. Esses novos sistemas produzirão até dezembro mais de 650 mil barris de petróleo por dia. A estatal adiantou que somente os campos do pré-sal atingirão a produção recorde de 500 mil barris médios por dia neste ano, chegando a picos de 600 mil barris diários. O recorde de produção no pré-sal, de 470 mil barris diários, foi registrado no último dia 11.

“- Pode ser que a Petrobrás consiga atingir o aumento da produção previsto, de 7,5%, o que vai significar, na realidade, a produção voltar aos patamares de 2011, de cerca de 2 milhões de barris por dia. O governo conta com esse aumento da produção para melhorar o caixa da companhia, para compensar a falta de reajuste de preços dos combustíveis – explica Pires.

“Especialistas lembram ainda que a Petrobrás também tem investido para aumentar a capacidade de refino. Eles citam a primeira unidade da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, que tem início de operação prevista para o fim deste ano, com capacidade de refinar 115 mil barris de petróleo por dia. Segundo Ernani Filgueiras, gerente executivo de Abastecimento e Petroquímica do IBP, os investimentos são essenciais para equilibrar o aumento no consumo nacional de combustíveis.

“- O ritmo de crescimento vai continuar na mesma proporção do ano passado, quando as vendas da gasolina subiram 4,2% e as do diesel, 4,6%. As importações vão continuar crescendo em 2014 e em 2015. Só com a entrada das novas refinarias é que haverá uma redução nesses volumes. Abreu e Lima vai produzir diesel e já começa a plena carga – diz Filgueiras.

“Para Alísio Vaz, presidente do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis (Sindicom), a venda será impulsionada este ano pelo aumento da demanda por gasolina, diesel e óleo combustível:

“- No caso da gasolina, haverá aumento das vendas por causa dos novos carros zero, que devem ter uma desaceleração, mas ainda assim vão ter alta. O diesel está associado à agricultura; e os óleos combustíveis, às térmicas.

“ Segundo o Plano Estratégico 2030 da Petrobrás, somente a partir de 2019 é que o Brasil caminhará para a autossuficiência em derivados, com a entrada da primeira unidade do Comperj (RJ) e da segunda unidade de Abreu e Lima, além de parte das novas refinarias no Nordeste, ainda em licitação.

“A meta de aumento de 7,5% da produção para este ano vem sendo classificada como agressiva por parte dos especialistas. No primeiro trimestre deste ano, a produção atingiu 1,922 milhão de barris por dia, alta de 1% em relação ao mesmo período do ano passado e queda de 2% em relação ao quarto trimestre de 2013. Alexandre Calmon, sócio da área de óleo e gás do Veirano Advogados, diz que o crescimento só será possível se não houver nenhum tipo de problema operacional.

“- Crescer 7,5% é claramente uma meta agressiva. Se não houver contrapontos, é factível. Mas há muitas variáveis, como as condições do meio ambiente. Manter o cronograma é como os estádios para a Copa: quanto mais fica em cima (da data de entrega), menor é a margem para administrar imprevistos. Além disso, imprevistos podem acontecer, pois esse é um negócio de risco – destaca Calmon.

“Por sua vez, a economista Paula Barbosa, especialista em óleo e gás, não acredita que a produção de petróleo cresça 7,5% neste ano. No entanto, ela reconhece o esforço que a companhia vem fazendo para aumentar a produção:

“- O mercado viu com bastante apreço o esforço que vem sendo feito pela gestão atual para reduzir custos, otimizar a produção em campos antigos e aumentar a produção. Mas acredito que, na melhor das hipóteses, a produção neste ano aumentará em torno de 4%.

“A economista lembrou que imprevistos sempre ocorrem, como atraso na entrega de equipamentos e problemas inesperados em sistemas e plataformas.

“- É claro que a gente quer que a Petrobrás atinja suas metas, e está realizando ações boas, como o aumento da produtividade em alguns campos na Bacia de Campos. Mas a meta deste ano é ver um céu de brigadeiro em um céu que está com nuvens escuras – afirma Paula.

“Já o professor Edmar Fagundes, do Grupo de Economia da Energia, do Instituto de Economia da UFRJ, acredita que a Petrobrás vai atingir o objetivo de crescimento deste ano, pois a companhia vem trabalhando em ritmo acelerado desde o ano passado. O desafio, segundo ele, é atingir a meta de produção de 3,2 milhões de barris por dia em 2018.

“- Acredito que, com todos esses sistemas que estão sendo colocados em operação, com a interligação de um número cada vez maior de poços com alta produtividade, como os do pré-sal na Bacia de Santos, ela (Petrobrás) conseguirá aumentar a produção neste ano. Mas creio que o desafio maior é depois, saltar de cerca de 2 milhões para 3,2 milhões de barris diários a partir de 2018 – destaca.

“Para o ex-diretor da Petrobrás Wagner Freire, a produção crescerá em 2014, mas menos do que o projetado pela empresa. Segundo ele, o plano de demissão voluntária (PDV) pode dificultar o gerenciamento de novos projetos:

“- Apesar de ter ótimos diretores, a dificuldade é o gerenciamento de seus projetos. Com o PDV, em dois anos haverá menos profissionais. E isso pode levar a dificuldades.

“André Donha, diretor da KPMG no Brasil, também ressalta a questão operacional como fator determinante para permitir o aumento da produção:

“- As paradas programadas, que vêm sendo feitas, são essenciais e já estão incluídas no cronograma da empresa. Essa programação é justamente para evitar as paradas corretivas, que são as piores e afetam a produção.

“Já Claudio Duhau, analista da corretora Ativa, prevê que a produção apresentará melhora nos próximos meses.

“- Crescer 7,5% é muito difícil, mas dá para chegar. Acho que se crescer 6% neste ano o mercado já vai gostar bastante – diz Duhau.” (Ramona Ordoñez e Bruno Rosa, O Globo, 26/5/2014.)

* Setor elétrico cobra medidas de redução de consumo

“Associações do setor elétrico acreditam que o governo está atrasado no que se refere à adoção de medidas preventivas para evitar um colapso no fornecimento de energia. Segundo as entidades, campanhas educativas e até mesmo programas de incentivo à redução do consumo deveriam ter sido adotados já no início da crise hidrológica que afeta os reservatórios das usinas. ‘Na visão do setor, essas são as alternativas mais recomendáveis neste momento. A situação é preocupante e você precisa dar sinais mais claros disso à população’, afirmou o presidente do Fórum de Associações do Setor Elétrico Brasileiro (Fase), Mário Menel.

‘A sinalização do governo até o momento é justamente no sentido contrário, com a redução das tarifas de energia elétrica através da MP 579’, completou o presidente do Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico (FMASE), Alexei Vivian. Em entrevista ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, representantes do setor consideram que a não aplicação das bandeiras tarifárias para a distribuidoras, prevista para o fim do ano passado, foi ‘uma oportunidade perdida’ no sentido de desestimular o desperdício de energia. As bandeiras sinalizariam para o consumidor o custo da energia gerada naquele período.

“Ainda de acordo com os especialistas, o ano eleitoral e a exposição do Brasil no cenário internacional por causa da realização da Copa do Mundo podem explicar a ausência de programas para a racionalização de energia. ‘E isso ocorre independentemente de partido. Qualquer governo teria, nesse contexto, receio de falar em medidas de restrição de consumo, ainda que não fale de racionamento’, disse Vivian.

“Apesar de considerar crítica a situação das hidrelétricas, a Fase, que agrega, entre outras associações, a Abrace (grandes consumidores), Abrage (grandes geradores) e Abraget (geradores termoelétricos), e a FMASE descartam a hipótese de um racionamento em 2014. ‘O risco sempre existe, mas a possibilidade efetiva de um racionamento ainda neste ano é praticamente nula’, disse Menel.

“Ontem (26/5), durante evento com analistas, executivos da Cemig citaram estudo da consultoria PSR, no qual a probabilidade de insuficiência dos reservatórios para atender à demanda por energia em 2014 seria de 46%. Os cálculos da PSR, feitos com base em dados oficiais de oferta, demanda e hidrologia utilizados pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), diferem da probabilidade de insuficiência de 6,7% apresentada pelo Ministério de Minas e Energia (MME) no início deste mês.

“Publicado em abril, o relatório da consultoria, sugere ainda uma redução de 6% no consumo mensal de energia entre maio e novembro com o objetivo de garantir a oferta de energia até 2015. ‘O grande problema é que estamos retardando uma solução para 2015, quando, então, dependeremos da quantidade de chuvas, o que torna o risco de um racionamento mais alto’.” (Gabriela Vieira e Luciana Collet, Estadão, 27/5/2014.)

* Por que só agora aumentar o biodiesel? Por que a opção pela gasolina que arrasou com o setor de etanol?

“A presidente Dilma autorizou ontem (28/5) o aumento da participação de biodiesel na mistura com o óleo diesel, utilizada tanto nos motores dos caminhões, como em boa parte das termoelétricas.

“A partir de 1.º de junho essa participação irá de 5% para 6%; e, a partir de 1.º de novembro, de 6% para 7%. O anúncio foi feito como se tratasse de uma decisão de excelência técnica que só trará benefícios: diversificará a matriz energética, reduzirá o consumo de derivados de petróleo, cria mais um mercado cativo para o setor da soja e melhora as condições operacionais da agricultura familiar.

“Se é tudo isso – e, de fato é -, por que então esse aumento da adição do biodiesel não foi providenciado antes, uma vez que há anos o setor enfrenta forte capacidade ociosa?

“O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, calcula que deixará de ser importado 1,2 bilhão de litros de óleo diesel por ano, o equivalente a uma despesa de US$ 1 bilhão, a preços de hoje, não incluídas aí as despesas com frete e seguros. Lobão também lembrou que mais biodiesel na mistura contribui para a redução de emissões de gás carbônico na atmosfera. Se é assim, por que o governo não reconheceu esses benefícios mais cedo, quando poderia ter reduzido ainda mais as importações de óleo diesel e ter contribuído também mais para preservar o meio ambiente?

“Mais interessado, no momento, em quebrar a resistência e a irrigação do agronegócio, que vem tratando a presidente Dilma com vaias e protestos explícitos ou difusos, o governo desconsiderou de repente dois argumentos a que vinha se agarrando para negar esse aumento da participação do biodiesel no coquetel com o óleo diesel: o primeiro deles, o de que encareceria demais os combustíveis, e o segundo, o de que os preços da mistura final ficariam mais vulneráveis aos vaivéns das cotações internacionais da soja, especialmente em períodos sujeitos a drásticas oscilações climáticas.

“Ontem (28/5), a presidente Dilma preferiu dizer que o impacto da nova mistura sobre a inflação ‘é insignificante’. Se, ao contrário do que vinha sustentando o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ‘é insignificante’, especialmente diante dos demais benefícios proporcionados, por que – outra vez – essa autorização veio só agora?

“No que diz respeito à vulnerabilidade das cotações da soja a períodos de seca dos grandes produtores mundiais, como Estados Unidos, Brasil e Argentina, ninguém chegou a levá-la em consideração.

“Curiosamente, os mesmos argumentos usados pelo governo Dilma para justificar esse aumento de biodiesel na mistura com o diesel impõem-se na defesa das vantagens de outro biocombustível, o etanol. E, no entanto, ao obrigar a Petrobrás a pagar parte da conta do consumidor de gasolina, além de avançar sobre o caixa da Petrobrás, a política do governo prostrou o setor do etanol, sem acenar até agora com nenhuma perspectiva de redenção.” (Celso Ming, Estadão, 29/5/2014.)

Escândalos na Petrobrás

* Ainda vai demorar para se ter a conta precisa dos prejuízos causados pelo aparelhamento da Petrobrás pelo PT e aliados

“Os estragos já conhecidos são enormes, mas só com mais contas e mais informações será possível avaliar com precisão os danos causados à Petrobrás, maior empresa brasileira, pelo aparelhamento de sua direção, pelo relaxamento dos controles, pelo populismo e pelos interesses pessoais e partidários encastelados a partir de 2003 no Palácio do Planalto. Erros políticos e administrativos levaram a desperdícios multibilionários, como no projeto da Refinaria Abreu e Lima, à perda de foco, à redução do fluxo de caixa, à elevação de custos, à insuficiência de investimentos e à queda de produção.

“É preciso levar esses fatores em conta para entender o aumento das importações de combustíveis, estimadas neste ano em US$ 18,8 bilhões – 4,5% mais que no ano passado -, segundo o Centro Brasileiro de Infra-estrutura (CBIE). Ou para entender os efeitos financeiros dos subsídios ao consumo interno de derivados de petróleo – no caso do gás de cozinha, uma perda de R$ 10,5 bilhões entre janeiro de 2011 e o primeiro trimestre deste ano, também de acordo com os cálculos do CBIE, dirigido pelo especialista Adriano Pires.

“O aumento dos gastos com a importação, 24,5%, será necessário para a empresa atender a um consumo 4% maior que o do ano passado. A Petrobrás poderá aumentar seu faturamento e melhorar suas condições financeiras, em 2014, se produzir 7,5% mais que no ano passado. Mas, se essa meta for alcançada, a produção apenas voltará ao nível de 2011, de cerca de 2 milhões de barris por dia, segundo comentário de Adriano Pires citado pelo Globo. Esses números indicam um duplo fracasso.

“Em 2006, fantasiado com o uniforme laranja do pessoal da Petrobrás, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou o Brasil autossuficiente em petróleo e ‘dono de seu nariz’ (este último detalhe evidencia uma visão primária da economia e do comércio internacional). Oito anos depois, o País continua dependente de importações. Isso poderia ter ocorrido simplesmente por incapacidade de acompanhar o aumento do consumo. Mas a história é mais feia: a produção diminuiu. Este é o segundo fracasso, explicável pelo investimento insuficiente e mal planejado.

“Enquanto se preparava para a exploração das reservas do pré-sal, a empresa perdia capacidade produtiva. Preparava-se mal, é preciso lembrar, porque o modelo irracional concebido pelo governo impõe à empresa uma participação extremamente custosa nas licitações. Isso tanto afeta a capacidade financeira da Petrobrás quanto limita a mobilização de grupos privados para a exploração das novas áreas.

“As perdas com o subsídio ao consumo de gás de cozinha também foram estimadas pelo CBIE. A estimativa é parcial, porque o governo, desde 2003, tem obrigado a empresa a manter os preços defasados.

“Só na gestão da presidente Dilma Rousseff o subsídio cortou R$ 10,5 bilhões do faturamento da empresa. O custo desse tipo de política é muito maior, no entanto, porque também o preço da gasolina é controlado politicamente. Em vez de combater a inflação, o governo tenta administrar os índices por meio do controle de preços e tarifas. Essa política tem afetado também as tarifas de transporte coletivo e de energia elétrica, provocando distorções na demanda e gerando enormes custos fiscais.

“A controles indevidos, como o de preços, é preciso somar os descontroles administrativos. Segundo um relatório de 2009 elaborado por um grupo de auditoria interna da Petrobrás, a área de abastecimento comprometeu milhões em contratos de fretes sem atender aos padrões mínimos em vigor na empresa.

“De acordo com o relatório, no ano anterior contratos informais envolveram despesas de US$ 278 milhões, noticiou a Folha de S.Paulo. Esta é mais uma informação sobre os padrões administrativos do ex-diretor de abastecimento Paulo Roberto Costa, preso por envolvimento em operações do doleiro Alberto Youssef e libertado na semana passada por ordem do ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal. É mais uma informação, também, sobre como um estilo de governo vem consumindo há anos a saúde da maior empresa brasileira.” (Editorial, Estadão, 27/5/2014.)

* Não param de surgir notícias sobre negócios altamente suspeitos envolvendo direta ou indiretamente a Petrobrás ou personagens ligados a ela

“A ofensiva do governo para inviabilizar os trabalhos de investigações sobre a Petrobrás no Congresso foi bem-sucedida. Isso do ponto de vista imediato e olhando-se exclusivamente para o Parlamento.

“A CPI do Senado caiu no ridículo. Com ela, seus integrantes e os dois depoentes (Sergio Gabrielli e Nestor Cerveró) que foram lá desmentir a eles mesmos. A comissão mista a ser instalada tampouco promete.

“O ex-presidente Luiz Inácio da Silva deu a ordem de ‘ir pra cima’ para evitar a CPI, lembrando no que resultou aquela iniciada com denúncia sobre os Correios, o Palácio do Planalto captou a mensagem, a base aliada achou mais prudente suspender temporariamente a rebeldia e deu-se a blindagem.

“Nem por isso param de surgir notícias sobre negócios altamente suspeitos envolvendo direta ou indiretamente a estatal ou personagens ligados a ela. Pelo simples fato de que as propostas de comissões parlamentares de inquérito apareceram quando já iam adiantadas investigações na Polícia Federal, Ministério Público e Tribunal de Contas.

“Portanto, não se depende de CPI para saber que a PF desconfia da existência de uma ‘organização criminosa’ atuando dentro da estatal. A suspeita surgiu pela descoberta de ligação entre a compra da refinaria de Pasadena (EUA) e o esquema de lavagem de dinheiro descoberto na Operação Lava Jato.

“Operação esta em que ‘brilham’ um ex-diretor da Petrobrás cheio de amizades com políticos e um doleiro conhecido da polícia e da Justiça de outros carnavais e cujas ligações com o mundo político atingem amplo espectro partidário.

“Também não é necessário CPI para que, de repente, a presidente Dilma Rousseff em pessoa se veja compelida a explicar melhor sua participação no negócio de Pasadena perante o Tribunal de Contas da União.

“Esses e tantos outros casos que todo dia surgem no noticiário, como o saque de US$ 10 milhões da conta da refinaria em uma corretora feito mediante autorização verbal. O dado consta em auditoria da própria Petrobrás, que considera a transação ‘normal’.

“Essas investigações em algum momento chegarão a alguma conclusão. Produzirão resultados que deixarão mais evidente que o motivo de ‘melar’ as CPIs era torpe.

“Muito provavelmente o PT conseguirá evitar esse barulho na eleição. Mas, e se perder e voltar a ser oposição? Pode se arrepender de ter enterrado o instrumento da CPI com o qual chegou a prestar bons serviços ao País.” (Dora Kramer, Estadão, 27/5/2014.)

O aparelhamento

* É trágica – e perigosa – a dimensão econômica e política do controle dos fundos das estatais pelo PT

“A disputa eleitoral para dois cargos de diretores e seis de conselheiros da Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (Previ) tem servido para lançar mais luz sobre o aparelhamento dos fundos de pensão das estatais pelo PT, principalmente, mas também por seus aliados. Informações detalhadas sobre a situação desse fundo, publicadas pelo jornal Valor, mostram como é feita e a que ponto chegou a sua ocupação pelo partido do governo, que, tudo indica, não deve ser diferente da dos demais fundos.

“Não contente em controlar a Previ, o PT e a central sindical que controla, a CUT, estenderam sua influência às dezenas de empresas das quais esse fundo é acionista. Um universo variado, que vai de petróleo a indústria aeronáutica, passando por bebidas e alimentos. Foram identificados pelo menos 50 representantes da Previ – petistas e aliados – nos conselhos de administração e fiscalização de 26 dessas empresas. A maioria – 27 – é de filiados do PT, de acordo com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

“Esse grupo já representa um terço dos 153 conselheiros das mais de 50 empresas nas quais o fundo tem interesses e, a continuar a marcha da companheirada no ritmo dos últimos anos, vai aumentar ainda mais.

“O surgimento de um grupo de oposição à chapa do PT/CUT que disputa a eleição para aqueles cargos tornou possível a manifestação de críticas que ajudam a esclarecer as práticas dos que tomaram de assalto os fundos de pensão. Os oposicionistas querem mudança na escolha dos dirigentes porque, como diz Cecília Garcez, ex-aliada do PT, ‘o sistema foi flexibilizado para que a experiência como dirigente sindical conte tanto quanto a de ter sido executivo em uma empresa’.

“A seu ver, alguns dos conselheiros ligados à CUT ‘não têm a menor preparação para sentar num conselho de grandes empresas privadas’. A Previ nega as acusações do grupo de oposição, sustentando que a escolha de conselheiros é feita com base em critérios técnicos e não partidários. Mas a lista de conselheiros levantada pelo Valor – com as ligações sindicais e partidárias de cada um, assim como os nomes das empresas para as quais foram indicados – dá razão à oposição.

“Essa questão está longe de ser apenas uma disputa fisiológica, uma luta por cargos e vantagens. Ela é isso também. Basta lembrar que os conselheiros indicados pela Previ são muito bem pagos pela participação nas reuniões a que têm a obrigação de comparecer. Sua remuneração varia de R$ 3 mil a R$ 47 mil, dependendo da empresa. Alega a Previ que para os funcionários da ativa que desempenham aquela função o valor máximo é de R$ 13,9 mil. Convenhamos que mesmo para eles é uma remuneração a que poucos brasileiros podem aspirar, ainda mais para o pouco trabalho que fazem.

“Mas o mais importante é a dimensão econômica e política do controle dos fundos das estatais pelo PT. Essas entidades têm um peso enorme na economia do País. O exemplo da Previ, o maior de todos os fundos, é ilustrativo. Para garantir as obrigações que tem com seus 198 mil associados, ela dispõe de ativos estimados em R$ 170 bilhões. O segundo maior, o Petros, dos funcionários da Petrobrás, administra ativos avaliados em R$ 66 bilhões.

“Esse caso vem lembrar mais uma vez que o PT tem uma noção aguda e precisa do que é o poder. Não o confunde com suas aparências. Sabe onde ele está de fato – no controle, ao mesmo tempo, dos fundos de pensão e da máquina do Estado. Não quer ser apenas o ‘partido da boquinha’, como o chamou maldosamente o deputado Anthony Garotinho, hoje seu aliado. O fisiologismo, mesmo desenfreado, é pouco. Ele quer muito mais, ainda que ao custo de comprometer, com sua ambição e irresponsabilidade, o desempenho dos fundos de pensão das estatais.

“É bom constatar, por isso, que dentro dos próprios fundos, como a Previ, já surge oposição a seus desígnios. Outro exemplo é a recente conquista, por uma chapa de oposição ao grupo PT/CUT, de importantes cargos na direção do Fundo de Pensão da Caixa Econômica Federal (Funcef), o terceiro maior do País.” (Editorial, Estadão, 27/5/2014.)

Protecionismo obscurantista

* Projeto petista: setor público fica proibido de comprar publicações estrangeiras. Nunca antes se foi tão longo no obscurantismo!

“O deputado Vicentinho (PT-SP) é autor do projeto de lei n9 7299/2014. que visa a proibir a compra de publicações estrangeiras pelo setor público. Ele alega que não se deve ‘favorecer o mercado externo em detrimento das produções nacionais’. Assim, as universidades, os hospitais e outros órgãos ficariam impedidos de importar livros científicos e demais publicações gráficas. Jamais se foi tão longe no propósito de ‘proteger’ a indústria.

“O projeto reflete a cultura do protecionismo arraigada na sociedade brasileira. A idéia faz sentido apenas no estágio inicial da industrialização. A Europa agiu assim no século XIX, quando buscou reproduzir o éxito da industrialização da Inglaterra.

“Alexander Gerschenkron (1904-1978) mostrou que países europeus não possuíam as condições que viabilizaram a Revolução Industrial. Cabia ao Estado, assim, provê-las em favor da industrialização.

“A indústria nascente seria protegida por barreiras à importação e incentivada por meios como o crédito. Bancos públicos financiaram a industrialização da França, da Bélgica e da Alemanha.

“No Brasil, a industrialização via substituição de importações começou na I Guerra e prosseguiu no período Vargas. Firmou-se depois da II Guerra sob a influência da Cepal e de seu ‘manifesto’ (1949); ‘Duas guerras mundiais em uma única geração e uma grande crise econômica entre elas evidenciaram as oportunidades dos países da América Latina e apontaram o caminho das atividades industriais’.

“A região se industrializou, mas grupos de interesse conseguiram perpetuar a proteção. Por isso, inibiu-se a inovação e seu papel na elevação da produtividade e na expansão do potencial de crescimento. A estratégia se esgotou nos anos 1980, vergada pelo peso da inflação, de crises cambiais e da concentração de renda. Tal industrialização pariu o ‘capitalismo de é economista compadres’, expressão criada por Stephen Haber para definir o processo em que os negócios de pessoas politicamente conectadas geram para si resultados melhores do que se fossem conduzidos de forma competitiva. Assim, vale mais aproximar-se do governo do que se dedicar à gestão das empresas. Muito influentes, esses grupos preservam seus interesses e inibem mudanças institucionais que os contrariam.

“Os efeitos negativos do protecionismo continuado justificavam a abertura da economia brasileira no governo Sarney, a qual foi ampliada por Collor e acelerada por FHC. A integração da indústria ao comércio mundial, dolorosa para muitos, contribuiu para sua modernização e para ganhos de produtividade que impulsionaram o crescimento no período Lula.

“‘Os países bem-sucedidos foram os que se engajaram no comércio exterior e aprofundaram sua integração com o resto do mundo’, dizem Fábio Giambiagi e Alexandre Schwartsman no excelente livro Complacência — Entenda por que o Brasil Cresce Menos do que Pode (Elsevier Editora, 2014). ‘As nações se engajam em trocas porque ganham ao se especializar em vez de tentar produzir tudo domesticamente’, concluem. Infelizmente, grande parte da classe política e da esquerda teima em desconhecer tais evidências.

“O governo atual sucumbiu à ideologia protecionista e ao lobby em prol do capitalismo de compadres. Ressuscitou velhas estratégias, como a exigência de conteúdo nacional mínimo em empreendimentos, caso do pré-sal. Indústrias que não se modernizaram são protegidas. Seus produtos costumam ser mais caros e menos eficientes. Incentivos que deveriam ser temporários se perpetuam.

“O exemplo do sucesso da Coréia do Sul é incapaz de inspirar o rompimento da crosta do protecionismo. Entre 1960 e 2010, segundo Giambiagi e Schwartsman, a participação das importações no PIB coreano aumentou de 13% para 50% (dados mais recentes citam 54%). O crescimento do PIB per capita no período foi, em média, de 5,7% ao ano (mais do que dobrou a cada dez anos). No Brasil, essa relação é hoje dos mesmos 13% da Coreia do Sul de cinquenta anos atrás. Na década de 60, a renda per capita deles era inferior à do Brasil. Hoje é mais de duas vezes maior.

“O projeto de Vicentinho é parte da enraizada cultura protecionista. Pode inibir o acesso ao conhecimento. Haja obscurantismo!” (Mailson da Nóbrega, economista, Veja, 28/5/2014.)

30 de maio de 2014

Outras compilações de provas da incompetência de Dilma e do governo:

Volume 120: Notícias de 18 a 24/10.

Volume 121: Notícias de 25 a 31/10.

Volume 122: Notícias de 8 a 14/11.

Volume 123: Notícias de 15 a 21/11.

Volume 124: Notícias de 22 a 28/11.

Volume 125: Notícias de 28/11 a 5/12.

Volume 126: Notícias de 6 a 12/12/2013.

Volume 127: Notícias de 10 a 16/1/2014.

Volume 128: Notícias de 17 a 23/1/2014.

Volume 129: Notícias de 24 a 30/1/2014.

Volume 130: Notícias de 31\1 a 6\2\2014,

Volume 131: Notícias de 7 a 13/2/2014. 

Volume 132: Notícias de 14 a 20/3/2014.

Volume 133 (Parte Um): Notícias de 21 a 27/3/2014. 

Volume 133 (Parte Dois): Notícias de 21 a 27/3/2014.

Volume 134: Notícias de 28/3 a 3/4/2014.

Volume 135 (Parte Um): Notícias de 4 a 10/4/2014. 

Volume 135 (Parte Dois): Notícias de 4 a 10/4/2014.

Volume 136 (Parte Um): Notícias de 11 a 17/4/2014. 

Volume 136 (Parte Dois): Notícias de 11 a 17/4/2014.

Volume 137: Notícias de 18 a 24/4/2014. 

Volume 138: Notícias de 25/4 a 1º/5/2014.

Volume 139: Notícias de 2 a 8/5/2014.

Volume 140: Notícias de 9 a 15/5/2014.

Volume 141: Notícias de 16 a 22/5/2014.

6 Comentários para “Más notícias do país de Dilma (142)”

  1. CONTAGEM REGRESSIVA.
    FALTAM APENAS 216 DIAS PARA O FIM DAS MÁS NOTICIAS.

    CAPITULAÇÃO: JÁ SE PERGUNTAM: E SE A MULHER GANHAR?

    NOSSO MEDO É A REELEIÇÃO DA DILMA E COM ISTO A CONTINUIDADE DA POLÍTICA NEOLIBERAL. A ECONOMIA BASEADA EM RANKINGS, PIBOES E PIBINHOS, E A CRESCENTE DESIGUALDADE.

  2. O mais amado mito dos conservadores, a insistência de que estamos vivendo em uma meritocracia, em que grandes fortunas são conquistadas e merecidas.

    Eric Hobsbown: “O objetivo da economia não é o ganho, mas sim o bem-estar de toda a população; o crescimento econômico não é um fim em si mesmo, mas um meio para dar vida a sociedades boas, humanas e justas.

    Ao invés de combater a pobreza, desigualdade, alienação, brutalidade policial ou a crise de legitimidade da democracia representativa em termos gerais, os governos tentam administrar a insurreição social, conduzindo-a na direção certa em processo de captura da agitação social na direção dos resultados políticos desejados.Abrem caminho para o policiamento com gestão violenta e/ou manipulativa dos efeitos imprevisíveis das manifestações populares em nome da “segurança nacional” e “segurança pública”.

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