Se roubar, faça

Obras sem projeto ou com projetos precários, caras, superfaturadas, com contratos aditados por uma, duas e sabe-se lá por quantas vezes. Boa parte delas atrasada, postergada, paralisada. Ano após ano, o governo joga nos bolsos de alguns poucos os bilhões de impostos dos muitos que trabalham e produzem riqueza, e que quase nada têm de volta. Algo de dar engulho, de alimentar a desesperança.

Mas a indignação da presidente Dilma Rousseff é o avesso disso. “Eu acho um absurdo parar obra no Brasil”, disse, ao comentar a recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU) ao Congresso Nacional de suspender a remessa de recursos para sete obras, todas elas com vícios graves, em que a roubalheira corre solta.

Para Dilma, o que importa é concluir o que for possível antes das eleições de 2014. Até porque o máximo que ela conseguir entregar será muito menos do que o prometido no palanque de 2010.

Em tom de desafio, de quem faz mesmo o diabo, garantiu: “De qualquer jeito, essa obra vai ficar pronta. E nós vamos inaugurá-la”. Uma variante do clássico “rouba, mas faz”, tão popular na política brasileira.

A presidente se referia à BR-448, extensão de 22,5 quilômetros entre Porto Alegre e Sapucaia do Sul, essencial para aliviar o tráfego saturado da BR-116 na região metropolitana da capital gaúcha. Em abril, a obra custaria R$ 530 milhões. Agora, já passa de R$ 1 bilhão. O TCU diz que R$ 91 milhões são originários de falcatruas. Mas Dilma afirma que vai inaugurar a obra assim mesmo.

As terras do sul esperam outra obra que já nasce atiçando pulgas por detrás das orelhas: a nova ponte sobre o Rio Guaíba, promessa de campanha, que teve seu edital publicado na quinta-feira, 7. Como não saiu do papel, a travessia ainda não é alvo do TCU. E, se não sofrer embargos, deve ficar pronta em 2020.

A estimativa em 2011 era de que a obra custaria em torno de R$ 400 milhões. Hoje, ultrapassa R$ 900 milhões. Isso para erguer uma ponte de menos de dois quilômetros. Mais de R$ 450 milhões por quilômetro, valor quase três vezes superior ao do quilômetro da maior ponte do mundo, de 42 quilômetros, construída entre Qingdao-Hiawann, na China.

Sobre as outras seis obras – esgoto em Pilar (AL), ferrovia Caetité-Barreiras (BA), Avenida Marginal Leste, Teresina (PI), Vila Olímpica de Parnaíba (PI), ponte sobre o Rio Araguaia (TO-PA) e ferrovia Norte-Sul –, Dilma não bateu de frente. Afinal, não tem chance de vê-las concluídas.

Podem apostar: a culpa por promessa não cumprida será do TCU, jamais de Dilma. Por sua vez, ela vai correr para acelerar o que der a qualquer custo. Não pode correr o risco de seu governo ser taxado como “rouba e não faz”.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 10/11/2013.

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