Em vez de Justiça, a minudência

Por uma minudência, por um entendimento a respeito de uma pequena tecnicalidade, o ministro Celso de Mello cometerá uma gigantesca, amazônica, abissal asneira.

Ele fará com que milhões e milhões de brasileiros deixem de ter respeito pela Justiça.

Não são muitos os brasileiros que respeitam o Legislativo. E não é à toa: a cada dia (ou melhor: a cada dia de trabalho dos legisladores, entre a terça e a quinta-feira, e olhe lá), o Legislativo trabalha com todas as suas forças para demonstrar que não é respeitável.

A imensa maioria dos brasileiros acha que os legisladores ganham demais e trabalham pouco. Na verdade, os legisladores trabalham muito; trabalham incansavelmente, diuturnamente, para mostrar ao povo brasileiro que eles ganham demais e só trabalham em nome de seus próprios interesses.

Fazem um esforço hercúleo para que o País os despreze, os abomine.

Quando um país despreza, abomina seus legisladores, caminha para o brejo.

***

Os brasileiros não têm muito por que admirar a Justiça.

A Justiça brasileira tarda demais, falha demais.

A Justiça costuma historicamente ser benevolente com os poderosos, e rigorosa com os humildes.

As leis contra os criminosos são lenientes. Há todo um arcabouço de leis que protegem os assassinos, os ladrões. Talvez por saber que as prisões brasileiras são o horror dos horrores, talvez pelo entendimento falsamente humanista de que os criminosos são criminosos por causa da sociedade como um todo, e não por eles próprios, a legislação e a Justiça são extremamente benevolentes com quem comete crime.

Difundiu-se amplamente no país que os juízes são privilegiados, ganham altíssimos salários, trabalham pouco, têm férias demais.

Nada é mais falso do que isso.

De fato, no topo da carreira do Judiciário há benesses demais. Mas a imensa maior parte dos juízes ganha apenas um salário digno, e trabalha como mouro, como camelo. E é gente digna, honesta.

Falo isso com propriedade, porque conheço muito de perto diversos juízes. Minha família tem mais juízes que jornalistas, e jornalistas, todos sabemos, é uma praga que dá mais do que chuchu na cerca.

***

Temos um Legislativo que trabalha herculeamente para ser odiado pelos cidadãos.

Temos uma Justiça que, apesar do esforço, do trabalho sério de milhares de juízes bem intencionados, não funciona, ou funciona mal. Que quando não tarda, falha.

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O ministro Celso de Mello é sério, trabalhador, bem intencionado. É digno, exemplar.

Ao contrário de trastes absurdos que jamais deveriam ter sido admitidos numa corte suprema, como Lewandowski e Toffoli, não julga por motivos políticos – isento, julga pela Lei.

Durante o julgamento dos bandidos, dos quadrilheiros do mensalão, fez declarações duríssimas. “Nada mais ofensivo e transgressor à paz pública do que a formação de quadrilha no núcleo mais íntimo e elevado de um dos Poderes da República com o objetivo de obter, mediante perpetração de outros crimes, o domínio do aparelho de Estado e a submissão inconstitucional do Parlamento aos desígnios criminosos de um grupo que desejava controlar o poder, quaisquer que fossem os meios utilizados, ainda que vulneradores da própria legislação criminal”.

Agora, por uma minudência, por um entendimento a respeito de que devem ser ouvidos ou não pelo Supremo Tribunal Federal os embargos infringentes, o digno, exemplar, sério, trabalhador, bem intencionado decano do STF vai jogar na lata de lixo o que resta de respeito dos brasileiros pelas instituições do País.

Por uma tecnicalidade, uma minudência boba, tola, pueril, o mais antigo membro da nossa corte suprema vai tornar toda a Justiça um alvo de dúvida. Mais: de desconfiança. Para não dizer de desprezo, de nojo, de ódio.

***

É inacreditável, mas ao se apegar a um detalhezinho de entendimento da letra fria da Lei (contrariamente ao entendimento de cinco de seus pares), o douto ministro Celso de Mello se afasta da Justiça como o diabo da cruz.

Merece as sete maldições da canção de Bob Dylan:

Que sejam sete as maldições a um juiz tão cruel:

Que um médico não possa salvá-lo,

Que dois curandeiros não possam curá-lo,

Que três olhos não possam vê-lo,

Que quatro ouvidos não possam ouvi-lo,

Que cinco muros não possam escondê-lo,

Que seis coveiros não possam enterrá-lo,

E que sete mortes nunca consigam matá-lo.

15 de novembro de 2013

2 Comentários para “Em vez de Justiça, a minudência”

  1. JUNTOS QUEM DIRIA?

    MILTINHO
    postado em 24/08/2013 às 4:37 pm | Permalink

    Segumdo o “Darth Vader” presidente do STF:

    A JUSTIÇA QUANDO TARDA FALHA!

    Tudo leva a Dylan!

    Estas são sete maldições sobre um juiz injusto!

    Que um médico não vai salvá-lo,
    Que dois curandeiros não vão curá-lo,
    Que três olhos não vão vê-lo.
    Que quatro orelhas não vão ouvi-lo,
    Que cinco paredes não vão escondê-lo,
    Que seis coveiros não vão enterrá-lo
    qUE sete mortes não consigam matá-l0

  2. UMA FAMÍLIA DE JORNALISTAS, PRAGA MELHOR QUE UMA FAMÍLIA DE JUÍZES.
    PORQUE O SEGREDO DE JUSTIÇA? TEREMOS QUE RECORRER AO OBAMA?

    “Segredo no inquérito 2474 vai na contramão da Lei da Transparência”

    Diz advogado de Brasília sobre o inquérito 2474, apelidado de “gavetão”. É paralelo ao 2245, que deu origem à Ação Penal 470, o chamado mensalão.

    Uma reportagem ingênua por por Conceição Lemes publicado em 4 de setembro de 2013 às 19:14

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