“Você é nosso e nós somos teu”

Português abaixo da crítica, conteúdo mais baixo ainda. Assim pode ser definida a mensagem do deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP) ao governador Sérgio Cabral, flagrado pelas câmaras do SBT durante reunião da CPI mista que deveria investigar as estripulias do contraventor Carlos Cachoeira. “A relação com o PMDB vai azedar. Mas não se preocupe. Você é nosso e nós somos teu.”

Embora não tenha revelado nada de novo, Vacarezza deu um azar danado.

Nos 83 toques em que confessa amor eterno ao governador do Rio, o ex-líder do governo na Câmara expôs com todas as letras o que muitos estão cansados de saber, mas jamais revelariam: a blindagem total aos que interessam – governo, PT e aliados amigos – em uma CPI patrocinada pela maioria, talvez a única na história.

Coisa que só a onipotência do ex-presidente Lula poderia conceber.

Precedida ou seguida de um “Por que? O que houve?” do preocupado interlocutor – algo a que poucos deram atenção -, o torpedo de Vaccarezza ganha potencial explosivo. Pode significar muito mais do que a óbvia proteção aos cupinchas. Deixa claro que de sério a CPI tem pouco ou quase nada. Coisa para a platéia ver.

Mas o que será que tanto apoquenta Cabral? Se, como diz, não aparece em gravação alguma, não precisaria de proteção adicional. Muito menos de informações online, no auge do debate, sobre o quadro de convocações da CPI.

Os guardanapos dos seus lhe perturbam a cabeça? Teme novas fotos? Novas revelações?

Os motivos que levariam líderes de primeira grandeza do PT a se indispor abertamente com o PMDB, maior aliado e detentor da vice-presidência da República, são ainda mais inexplicáveis. Só mesmo encrencas das grandes valeriam tal preço.

Questões se amontoam às dezenas. Poucas serão respondidas a se medir pela primeira lista de convocações da CPI, todas para ouvir o que a Policia Federal já cansou de ouvir.

Uma comissão que se faz de inútil. Que, por escolha e gosto, desconsidera descalabros atrás de descalabros sob o argumento de que não se enquadram no escopo das investigações.

Imaginam, também por escolha e gosto, que investigações têm limites controláveis, esquecendo-se que a CPI mais devastadora já realizada no país começou com um alvo, o pagamento de propina nos Correios, e achou outro muito mais gigantesco, o mensalão.

Por essas e outras, é melhor proteger uns e outros, mandar torpedos e SMS – já que ligações telefônicas são perigosas demais – e tentar não dar sorte para o azar. Para quem deve e teme, não é um risco que dê para correr.

Este artigo foi originalmente publicado no Blog do Noblat, em 20/5/2012.

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